A Igreja deve celebrar as festas do calendário litúrgico?

No Brasil, a maioria das igrejas evangélicas celebram somente duas festas do calendário litúrgico: o Natal e a Páscoa. Mas o calendário litúrgico completo inclui outras celebrações: Advento, Quaresma, Ascensão, Pentecostes e outras. Meu objetivo neste estudo é explicar porque eu creio que a Igreja não deve promover nenhuma dessas celebrações, nem mesmo o Natal e a Páscoa.

Antes de dar minhas razões, quero enfatizar que defender a posição que eu defendo não significa que eu necessariamente considere como falsas as igrejas que pensam diferente. Afinal, o fato de alguém ser um filho de Deus não significa que ele estará sempre certo sobre tudo. Sendo assim, o fato de haver discordâncias entre irmãos em Cristo não significa que deixam de ser irmãos. Ao mesmo tempo, o fato de serem legítimos irmãos não significa que não precisam crescer e amadurecer espiritualmente. Todos devem buscar constante crescimento na compreensão e na prática da Palavra de Deus em todas as áreas de suas vidas. Eu mesmo não cheguei às conclusões que defendo neste estudo do dia para a noite. Pelo contrário, para chegar ao meu atual posicionamento, foram cerca de 2 anos de estudos e reflexões em meu ministério pastoral. Minha intenção aqui não é debater com ímpios, mas dialogar com irmãos.

DEFININDO A QUESTÃO

Quando digo que a Igreja não deve promover as festas do calendário litúrgico, o que exatamente eu estou dizendo? Cada festa tem um tema específico. O tema do Natal, por exemplo, é o nascimento de Jesus Cristo. Então, uma igreja que promove a festa do Natal é uma igreja que, a cada dia 25 de dezembro (ou em dias próximos do dia 25 de dezembro), faz do nascimento de Cristo o tema central do culto e de outras atividades da Igreja. Significa que, nessa época do ano, todas as atividades da igreja, especialmente os sermões e a música da igreja, se voltam para o tema da festa, que é o nascimento de Cristo. Então, quando eu digo que a Igreja não deve promover o Natal (ou qualquer outra festa do calendário litúrgico), o que eu estou dizendo é que a Igreja não deve pré-estabelecer que o nascimento de Cristo será sempre o tema central do culto e de outras atividades da Igreja nessa época do ano.

Tendo definido o que eu quero dizer, creio que também é importante, para evitar maus entendidos,  esclarecer o que eu não estou dizendo. Eu não estou dizendo que é pecado que a Igreja celebre o nascimento ou que o nascimento de Cristo não pode ser o tema central de um culto. Pelo contrário, creio que o nascimento de Cristo é um dos mais importantes artigos da fé cristã e, por isso, deve ser ensinado e celebrado com regularidade na igreja. O que eu estou dizendo é que a Igreja não deve estabelecer uma data fixa anual em que o nascimento de Cristo é sempre o tema central do culto e de outras atividades da Igreja naquela mesma data.

O OFÍCIO DO ESPÍRITO E O MINISTÉRIO DE ENSINO DA IGREJA

A Bíblia ensina que “o homem natural não compreende as coisas do Espírito de Deus, porque lhe parecem loucura; e não pode entendê-las, porque elas se discernem espiritualmente” (1 Coríntios 2:14). Para que alguém se converta, é necessário um milagre divino operado pelo Espírito Santo (1 Coríntios 2:12; João 3:5; Romanos 8:15-16), pois o homem não tem em si mesmo a capacidade de se converter (João 6:44). Além disso, mesmo no caso do homem que já é convertido, ele continua dependendo da obra do Espírito Santo para se santificar e perseverar na fé (Ezequiel 36:27; Romanos 8:4-9; Gálatas 5:16).

O principal meio que o Espírito de Deus utiliza para converter os pecados e santificar os que já são convertidos é a pregação e o ensino da Palavra de Deus:

Romanos 10
(13)  Porque todo aquele que invocar o nome do Senhor será salvo.
(14)  Como, pois, invocarão aquele em quem não creram? e como crerão naquele de quem não ouviram? e como ouvirão, se não há quem pregue?
(15)  E como pregarão, se não forem enviados? como está escrito: Quão formosos os pés dos que anunciam o evangelho de paz; dos que trazem alegres novas de boas coisas.
(17) De sorte que a fé é pelo ouvir, e o ouvir pela palavra de Deus.

1 Coríntios 1
(17) Porque Cristo enviou-me, não para batizar, mas para evangelizar; não em sabedoria de palavras, para que a cruz de Cristo se não faça vã.
(18) Porque a palavra da cruz é loucura para os que perecem; mas para nós, que somos salvos, é o poder de Deus.
(21) Visto como na sabedoria de Deus o mundo não conheceu a Deus pela sua sabedoria, aprouve a Deus salvar os crentes pela loucura da pregação.

Salmo 119
(9) Com que purificará o jovem o seu caminho? Observando-o conforme a tua palavra.
João 17
(17) Santifica-os na tua verdade; a tua palavra é a verdade.

Como a pregação e o ensino da Palavra de Deus é o instrumento do Espírito de Cristo para salvar os homens de seus pecados, a Igreja deve se manter muito ativa em sua função de pregar e ensinar todos os artigos da fé cristã ao mundo. Ou seja, os pregadores da Igreja devem anunciar ao mundo que o Verbo se fez carne para salvar os pecadores através de sua vida, morte e ressurreição.  João Calvino escreveu:

“Ao ser denominada coluna e fundamento da verdade, tal dignidade atribuída à Igreja não é algo ordinário. Ora, que termos mais sublimes poderia ele ter usado para descrevê-la? Porquanto não existe nada mais venerável e santo do que aquela verdade que abrange tanto a glória de Deus quanto a salvação do homem. Fossem todos os louvores que os admiradores esbanjam em referência à filosofia pagã, reunidos num montão, o que seria isso comparado com a excelência dessa sabedoria celestial, a única que leva o título de a luz e a verdade e a instrução para a vida e o caminho e o reino de Deus? Esta verdade, porém, só é preservada no mundo através do ministério da Igreja.  Daí, que peso de responsabilidade repousa sobre os pastores, a quem se tem confiado o encargo de um tesouro tão inestimável! (…) A Igreja é a coluna da verdade porque, através de seu ministério, a verdade é preservada e difundida. Deus mesmo não desce do céu para nós, nem diariamente nos envia mensageiros angelicais para que publiquem sua verdade, senão que usa as atividades dos pastores, a quem destinou para esse propósito. Ou, expondo-o de maneira mais simples: não é a Igreja a mãe de todos os crentes, visto que ela os conduz ao novo nascimento pela Palavra de Deus, educa e nutre toda a sua vida, os fortalece e finalmente os guia à plenitude de sua perfeição? A Igreja é chamada coluna da verdade pela mesma razão, pois o ofício de ministrar a doutrina que Deus pôs em suas mãos é o único meio para a preservação da verdade, a qual não pode desaparecer da memória dos homens“. (João Calvino, Comentário de 1 Timóteo 3:15)

E como a pregação e o ensino da Palavra de Deus é um instrumento espiritual para produzir resultados espirituais, não devemos crer que é uma tarefa que pode ser realizada por qualquer um e de qualquer maneira. Se a pregação da Palavra pudesse ser realizada por qualquer um e de qualquer maneira, não seria necessário um dom específico do Espírito Santo:

Romanos 12
(3) Porque pela graça que me é dada, digo a cada um dentre vós que não pense de si mesmo além do que convém; antes, pense com moderação, conforme a medida da fé que Deus repartiu a cada um.
(4) Porque assim como em um corpo temos muitos membros, e nem todos os membros têm a mesma operação,
(5) Assim nós, que somos muitos, somos um só corpo em Cristo, mas individualmente somos membros uns dos outros.
(6) De modo que, tendo diferentes dons, segundo a graça que nos é dada, se é profecia, seja ela segundo a medida da fé;
(7) Se é ministério, seja em ministrar; se é ensinar, haja dedicação ao ensino;

1 Coríntios 12
(28) A uns estabeleceu Deus na igreja, primeiramente, apóstolos; em segundo lugar, profetas; em terceiro lugar, mestres; depois, operadores de milagres; depois, dons de curar, socorros, governos, variedades de línguas.
(29) Porventura, são todos apóstolos? Ou, todos profetas? São todos mestres? Ou, operadores de milagres?

O que tudo isso deixa claro é que, para que o ensino da Palavra de Deus tenha eficácia espiritual, é necessário que Deus opere tanto no pregador quanto no ouvinte.  É necessário que Deus habilite o pregador para pregar e é necessário que ele capacite o ouvinte para ouvir. Se Deus não operar no pregador e no ouvinte, as palavras podem até ser verdadeiras, mas serão espiritualmente ineficázes para operar qualquer genuína transformação no pecador. Como está escrito:

“E no dia de sábado saímos fora das portas, para a beira do rio, onde se costumava fazer oração; e, assentando-nos, falamos às mulheres que ali se ajuntaram. E uma certa mulher, chamada Lídia, vendedora de púrpura, da cidade de Tiatira, e que servia a Deus, nos ouvia, e o Senhor lhe abriu o coração para que estivesse atenta ao que Paulo dizia“. (Atos 16:13-14)

JESUS CRISTO, A CABEÇA DA IGREJA

Os operações do Espírito Santo no homem, através dos dons que ele distribui, fazem parte do governo de Cristo sobre a Igreja como sua cabeça:

1 Coríntios 12
(4) Ora, há diversidade de dons, mas o Espírito é o mesmo.
(5) E há diversidade de ministérios, mas o Senhor é o mesmo.
(6) E há diversidade de operações, mas é o mesmo Deus que opera tudo em todos.
(7) Mas a manifestação do Espírito é dada a cada um, para o que for útil.
(12) Porque, assim como o corpo é um, e tem muitos membros, e todos os membros, sendo muitos, são um só corpo, assim é Cristo também.
(13) Pois todos nós fomos batizados em um Espírito, formando um corpo, quer judeus, quer gregos, quer servos, quer livres, e todos temos bebido de um Espírito.
(14) Porque também o corpo não é um só membro, mas muitos.
(15) Se o pé disser: Porque não sou mão, não sou do corpo; não será por isso do corpo?
(16) E se a orelha disser: Porque não sou olho não sou do corpo; não será por isso do corpo?
(17) Se todo o corpo fosse olho, onde estaria o ouvido? Se todo fosse ouvido, onde estaria o olfato?
(18) Mas agora Deus colocou os membros no corpo, cada um deles como quis.
(19) E, se todos fossem um só membro, onde estaria o corpo?
(20) Assim, pois, há muitos membros, mas um corpo.
(21) E o olho não pode dizer à mão: Não tenho necessidade de ti; nem ainda a cabeça aos pés: Não tenho necessidade de vós.
(27) Ora, vós sois o corpo de Cristo, e seus membros em particular.
Efésios 5
(23) Porque o marido é a cabeça da mulher, como também Cristo é a cabeça da igreja, sendo ele próprio o salvador do corpo.
Colossenses 1
(18) E ele é a cabeça do corpo, da igreja; é o princípio e o primogênito dentre os mortos, para que em tudo tenha a preeminência.

É importante observar que, em 1 Coríntios 12, o Espírito Santo é o meio pelo qual Cristo, como cabeça, governa a Igreja, que é o seu corpo. O Espírito é o que faz com que o corpo seja um corpo. “Pois todos nós fomos batizados em um Espírito, formando um corpo…” (1 Coríntios 12:13). O que faz com que cada membro do corpo seja parte do corpo é a a presença e a operação de Cristo através do Espírito.

Sendo assim, para que o ministério de ensino da Igreja seja espiritualmente eficaz, é necessário que os mestres sejam especialmente capacidados pelo Espírito de Deus e que, aqueles que foram capacitados, exerçam o ministério de ensino da maneira que Cristo, a cabeça, determinou.

COMO ME CONVÉM FALAR

Uma das razões pelas quais é tão importante que o pregador se coloque na dependência do Espírito Santo para exercer seu ministério de ensino é que nós não sabemos o que se passa nos corações daqueles que nos ouvem. Não temos meios de saber o que o público precisa ouvir. Aliás, em muitos casos, nem as próprias pessoas sabem o que elas realmente precisam ouvir. Quem realmente sabe do que precisamos é Jesus Cristo, pois ele é “aquele que sonda os rins e os corações” (Apocalipse 2:23). Como está escrito também: “Todo caminho do homem é reto aos seus olhos, mas o SENHOR sonda os corações” (Provérbios 21:2). Por isso, precisamos exercer nosso ministério de ensino na dependência do Espírito de Cristo. Embora não saibamos o que se passa nos corações dos homens, o Senhor sabe. Através de seu Espírito, ele opera nos membros de seu corpo, os pregadores, para que eles falem as coisas que o coração do homem precisa ouvir. Não o que os homens querem ouvir, mas o que eles precisam ouvir. É sobre isso que o apóstolo escreveu aos Colossenses:

Perseverai em oração, velando nela com ação de graças; orando também juntamente por nós, para que Deus nos abra a porta da palavra, a fim de falarmos do mistério de Cristo, pelo qual estou também preso; para que o manifeste, como me convém falar”. (Colossenses 4:2-4)

Aqui o apóstolo Paulo pede que os membros da igreja em Colosso orassem por ele e por Timóteo (Colossenses 1:1), que eram pregadores da Palavra. Ele diz que eles deveriam orar por duas coisas. Primeiro, para que Deus criasse oportunidades para a pregação, “para que Deus nos abra a porta da palavra, a fim de falarmos do mistério de Cristo“. O mistério de Cristo são os dogmas do Cristianismo, como a encarnação do Verbo, a morte de Cristo, sua ressurreição e ascensão. Mas Paulo não queria somente que Deus criasse oportunidades para que ele e Timóteo pudessem pregar. Ele diz que também precisava se guiado por Deus na maneira de pregar, “para que o manifeste, como me convém falar”.  Isso mostra que Paulo que, como pregador, ele se colocava na completa dependência de Deus. Ele dependia de Deus para criar oportunidades para a pregação da Palavra e, quando essas oportunidades surgiam, ele dependia de Deus para guiá-lo na maneira apropriada de pregar. Ou seja, Paulo entendia que sua capacidade de pregar e ensinar com eficácia espirtiual não vinha dele mesmo, mas de Deus: “Não que sejamos capazes, por nós, de pensar alguma coisa, como de nós mesmos; mas a nossa capacidade vem de Deus“. (2 Coríntios 3:5) “Pois, quem é Paulo, e quem é Apolo, senão ministros pelos quais crestes, e conforme o que o Senhor deu a cada um? Eu plantei, Apolo regou; mas Deus deu o crescimento. Por isso, nem o que planta é alguma coisa, nem o que rega, mas Deus, que dá o crescimento“. (1 Coríntios 3:5-7)

Essa consciência de que, como pregador, ele precisava que Deus abrisse as portas e que Deus manifestasse o que ele deveria falar, é o que direcionava Paulo a orar e a pedir que outros orassem por ele. Ou seja, colocar-se na dependência do Espírito significa aplicar-se às orações.

Quando o pregador se coloca na dependência do Espírito de Cristo, humildemente pedindo para ser direcionado naquilo que deve pregar e ensinar, esperando com confiança naquele que é o único que sonda os corações e sabe do que verdadeiramente precisamos, o resultado é que Deus responde suas orações, tornando sua pregação espiritualmente poderosa. Por outro lado, aqueles que não buscam o direcionamento de Deus para cada ocasião não tem razões para esperar o auxílio do Espírito no exercício de seu ministério de ensino.

A preocupação de Paulo com o direcionamento do Espírito de Cristo também demonstra que, para que uma pregação seja espiritualmente eficaz e poderosa, não é suficiente que ela seja biblicamente verdadeira. Evidentemente, é necessário que ela seja biblicamente verdadeira. Mas também é necessário que a mensagem seja apropriada para cada ocasião e situação.  Se alguém tem envolvimento com um determinado tipo de pecado ou heresia, ele precisa ouvir palavras que tenham relação com aquele tipo específico de pecado ou heresia. Se alguém é ocioso, ele precisa ouvir o que a Bíblia ensina sobre como Deus quer que usemos o nosso tempo. Se alguém tem problemas com pornografia, ele precisa ouvir o que a Bíblia ensina sobre pureza sexual. Se alguém não crê na divindade de Cristo, ele precisa ouvir o que a Bíblia ensina sobre a Trindade Santíssima. Se alguém não entende o que significa ser justificado, ele precisa ser ensinada sobre a doutrina da justificação pela fé somente. Não sabemos quais são os reais conflitos que existem nos corações das pessoas. Por isso, o fato de algo ser biblicamente verdadeiro não significa que é o que as pessoas estão precisando ouvir naquele momento. Se um cristão enfrenta tentações na área sexual, mas não na ociosidade, ele precisa ouvir mais palavras sobre a pureza sexual do que sobre a ociosidade. Se ele ouvir uma palavra sobre a ociosidade, a palavra pode até ser biblicamente verdadeira, mas não será tão impactante para sua vida quanto as palavras que ele precisa ouvir sobre pureza sexual. Novamente, para que uma pregação seja espiritualmente eficaz e poderosa, não é suficiente que ela seja biblicamente verdadeira. É necessário também que ela seja a palavra apropriada para aquela ocasião e situação.

SUBSTITUINDO O GOVERNO DO ESPÍRITO PELO CALENDÁRIO LITÚRGICO

Com base no que foi dito até aqui, creio ser inevitável a conclusão de que os dias de festa do calendário litúrgico contradizem diretamente o que a Escritura ensina sobre o governo do Espírito sobre a Igreja. Se eu pré-estabelecer que, em uma determinada época do ano, eu sempre tenho que falar sobre o mesmo artigo de fé, sobre o mesmo tema bíblico, eu estou deixando de humildemente buscar em Deus direcionamento sobre o que eu devo falar. O Espírito Santo não nos ensina na Escritura que todas as igrejas do mundo devem separar o mês de dezembro para enfatizar especificamente a doutrina do nascimento de Cristo ou que devemos separar quarenta dias do mês de março ou de abril para enfatizar especificamente a doutrina do arrependimento (no tempo da Quaresma). O Espírito Santo nos ensina na Escritura que devemos ensinar a doutrina do nascimento de Cristo e que devemos pregar o arrependimento, mas não diz que há períodos do ano em que esses assuntos precisam ser enfatizados de maneira especial. E se Deus quiser que eu passe o mês de dezembro pregando sobre a paixão e a ressurreição de Cristo e que eu passe o mês de abril pregando sobre o nascimento de Cristo? O Espírito Santo não ensinou na Escritura que há determinadas épocas do ano em que eu tenho que sempre enfatizar os mesmos artigos da fé. Para que o pregador saiba o que ele precisa enfatizar em sua igreja nos meses de dezembro, março ou abril, ele deve humildemente orar ao Pai, pedindo direcionamento sobre o que convém falar, sabendo que Deus é o único que verdadeiramente sabe quais são as necessidades específicas de sua igreja.

Pregadores que não buscam o direcionamento de Deus para cada ocasião não tem razões para esperar o auxílio do Espírito na hora de pregar. Se eu pretendo pregar sobre um determinada assunto em data específica ou se eu pretendo passar um mês ou um ano falando sobre o mesmo assunto, isso deve ser decidido em espírito de oração, buscando o direcionamento do Espírito de Cristo, que é a cabeça da Igreja. Estabelecer uma data fixa para cada assunto é estabelecer o que eu tenho que pregar à parte do governo do Espírito. E onde o Espírito de Cristo não é livre para governar, direcionando-nos conforme a necessidade de nossa igreja, não há razão para esperarmos que o sermão será espiritualmente poderoso, pois a eficácia do ministério de ensino da Igreja depende inteiramente da operação do Espírito de Deus (1 Coríntios 12:28).

Novamente, o que eu estou dizendo não é que é pecado que a Igreja celebre o nascimento de Cristo (ou sua morte, ressurreição, ascensão, etc.) ou que o nascimento de Cristo não pode ser o tema central de um culto, mas somente que a Igreja não deve estabelecer uma data fixa anual em que o nascimento de Cristo tem que ser o tema central do culto e de outras atividades da Igreja naquela mesma data. A discussão não é se o nascimento e a ressurreição de Cristo devem ser celebrados pela igreja ou não. Todo cristão acredita que o nascimento e a ressurreição de Cristo devem ser celebrados pela Igreja.  Se eu pregar um sermão baseado em Mateus 1:18-25, se eu cantar o Salmo 40 (cf. Hebreus 10:7-9) ou se eu celebrar a Ceia do Senhor, eu já estou celebrando o nascimento de Cristo. Afinal, o pão da Ceia do Senhor significa que o Verbo se fez carne. Quando uma igreja celebra o Natal ou a Páscoa em seus cultos, essa igreja não está simplesmente celebrando o nascimentou ou a ressurreição de Cristo. O que ela está fazendo é estabelecer uma data fixa em que esses acontecimentos necessariamente serão enfatizados. Ou para ser mais exato, o que ela está fazendo é aceitar datas estabelecidas com base na autoridade de homens. Mas se a Escritura diz que devemos buscar em Deus o que devemos pregar, orar e cantar, quem somos nós para pré-estabelecermos essas datas fixas anuais? Quem somos nós para privar Cristo de seu direito de conduzir sua Igreja a passar o mês de dezembro inteiro falando sobre sua ascensão ou sobre os seis dias da criação dos céus e da terra, caso ele queria?

Quando o Espírito de Cristo opera, ele produz em em nós “amor, gozo, paz, longanimidade, benignidade, bondade, fé, mansidão e domínio próprio” (Gálatas 5:22). Quando o Espírito de Cristo não opera, as obras da carne prevalecem. Por isso, é tão importante que a Igreja trabalhe na dependência do Espírito. Sem o Espírito, toda a nossa organização eclesiástica não será “valor algum senão para a satisfação da carne” (Colossenses 2:23). Talvez isso explique porque, em minha experiência, a época do Natal é a época do ano em que eu mais vejo as igrejas se afastarem do culto espiritual.  Já vi diversos casos de igrejas que, ao longo do ano, parecem se esforçar para manter a pureza da pregação e do culto, mas que, na época do Natal, repentinamente introduzem coisas como peças de teatro, imagens de Cristo e até removem a pregação do culto. Conheço muitas igrejas também em que essa é a época do ano em que as pessoas mais faltam, em muitos casos simplesmente porque estão celebrando o Natal em casa e dando atenção para visitas. À luz do que a Bíblia diz, podemos atribuir esse tipo de coisa às operações do Espírito de Cristo? Ou será que não são simplesmente as consequências de ceifarmos na carne em vez de buscarmos o direcionamento do Espírito? “Porque o que semeia na sua carne, da carne ceifará corrupção” (Gálatas 6:8).

A AB-ROGAÇÃO DOS DIAS DE FESTA INSTITUÍDOS POR DEUS

No Velho Testamento, Deus instituiu diversos dias de festa (Levítico 23). Por exemplo, no dia 14 do primeiro mês, os judeus deveriam celebrar a libertação da escravidão do Egito (Êxodo 12). Isso significa que, a cada dia 14 do primeiro mês, os judeus deveriam voltar suas mentes para esse evento histórico – a libertação da escravidão do Egito. Como a Páscoa foi instituída por Deus, a celebração da festa da Páscoa era um instrumento eficaz do Espírito de Deus para operar graça em seu povo. Outro dia de festa instituído por Deus no Velho Testamento foi o Dia da Expiação. No Dia da Expiação, os crentes tinham que passar o dia meditando nas doutrinas da expiação e do arrependimento e se arrependendo dos próprios pecados:

“Mas aos dez dias desse sétimo mês será o dia da expiação; tereis santa convocação, e afligireis as vossas almas; e oferecereis oferta queimada ao SENHOR. E naquele mesmo dia nenhum trabalho fareis, porque é o dia da expiação, para fazer expiação por vós perante o SENHOR vosso Deus. Porque toda a alma, que naquele mesmo dia se não afligir, será extirpada do seu povo”. (Levítico 23:27-29)

Novamente, como essa uma ordenaça instituída por Deus, era um instrumento eficaz do Espírito de Deus para operar perdão e arrependimento no seu povo. Se um dia de festa tinha um tema específico, o adorador tinha a obrigação de voltar seus pensamentos para o tema daquela festa. Se o tema era a expiação e o arrependimento, ele tinha que passar o dia afligindo sua alma em arrependimento. Se o tema era a libertação da escravidão do Egito, o adorador tinha que voltar seus pensamentos para isso. Eram meios de Deus operar no coração do pecador.

Todavia, no tempo do Novo Testamento, Deus ab-rogou todos os dias de festa do Velho Testamento (Colossenses 2:16; Gálatas 4:10). Deus ab-rogou, por exemplo, a Páscoa, que celebrava a libertação de Israel da escravidão do Egito, e ele ab-rogou o Dia da Expiação, que era dedicado às doutrinas da expiação e do arrependimento. Isso significa que Deus não quer que a Igreja do Novo Testamento saiba da libertação do Egito ou que a Igreja não saiba compreenda as doutrinas da expiação e do arrependimento? Evidentemente, a questão não é essa, pois ele preservou a memória dessas coisas nas Sagradas Escrituras. O que ele não quer é que a Igreja continue a ter uma data fixa anual para celebrar esses acontecimentos e essas doutrinas. Se Deus quisesse que a Igreja tivesse datas fixas anuais para enfatizar a doutrina da expiação e do arrependimento, como é o caso do tempo da Quaresma no calendário litúrgico, ele não teria ab-rogado o Dia da Expiação ou então ele teria instituído novos dias da expiação para o Novo Testamento. Mas não foi isso que Deus fez.

Diante disso, uma pergunta é inevitável: se no Velho Testamento, Deus quis instituir dias de festas fixas anuais, festas que aconteciam anualmente em determinados períodos do ano, e se no Novo Testamento ele quis ab-rogar essas festas, por que ele não instituiu novas festas anuais no lugar das antigas? O Advento, o Natal, O Tempo da Quaresma, a Sexta-Feira da Paixão, a Páscoa, o Dia de Pentecostes, o Dia da Ascensão – nenhuma dessas celebrações do calendário litúrgico foi instituída por Cristo ou pelos apóstolos. Todas foram introduzidas pela Igreja depois da morte dos apóstolos. Ou seja, diferente das festas do Velho Testamento, que existiam sob a autoridade do próprio Deus e, portanto, eram instrumentos das operações do Espírito, essas festas do calendário litúrgico existem por autoridade humana e, portanto, não podem reivindicar para si a mesma autoridade divina. Mas, novamente, se Deus instituiu festas fixas anuais antes, por que ele não fez o mesmo agora? Creio que a resposta evidente é que ele não quis que a Igreja do Novo Testamento tivessem esse tipo de festa fixa. Afinal, não temos meios de saber qual é a vontade revelada de Cristo para sua Igreja, exceto com base no que os apóstolos nos instruíram (cf. 1 Tessaloniscenses 4:1-2; Mateus 28:20).

AS FESTAS DO CALENDÁRIO LITÚRGICO PODEM COMBATER O SECULARISMO?

Alguns argumentam que as festas do calendário litúrgico são necessárias para combater o secularismo das nações modernas. Todavia, isso é implicitamente negar a suficiência das ordenanças de Cristo para combater o pecado. Secularismo é pecado. É a cosmovisão pecaminosa das nações que atualmente se esquecem de Deus. “Os ímpios serão lançados no inferno, e todas as nações que se esquecem de Deus” (Salmo 9:17). Quando Cristo enviou os apóstolos para ensinar as nações, seu desejo era que as nações fossem salvas do pecado. Para que os apóstolos fossem bem sucedidos nessa missão, eles deveriam ensinar tudo o que Cristo ensinou: “Portanto ide, ensinai as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo; ensinando-os a guardar todas as coisas que eu vos tenho mandado; e eis que eu estou convosco todos os dias, até a consumação dos séculos. Amém”. (Mateus 28:19-20) Ou seja, as coisas que Cristo ensinou aos apóstolos é suficiente para que as nações sejam salvas. Como os apóstolos não instituíram as festas do calendário litúrgico como meios eficázes de salvar as nações do secularismo, não temos o direito de dizer que essas festas são necessárias. Armas carnais não são capazes de livrar os povos de seus pecados (como o pecado do esquecimento de Deus). Precisamos confiar nos instrumentos do Espírito. As ordenanças de Cristo são suficientes para que a Igreja prevaleça na guerra contra o secularismo.

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