“E aconteceu que, concluindo Jesus estes discursos, saiu da Galiléia, e dirigiu-se aos confins da Judéia, além do Jordão; e seguiram-no grandes multidões, e curou-as ali. Então chegaram ao pé dele os fariseus, tentando-o, e dizendo-lhe: É lícito ao homem repudiar sua mulher por qualquer motivo?” (Mateus 19:1-3)
JESUS CONTRA MOISÉS?
Os fariseus não fizeram essa pergunta a Jesus porque eles estavam genuinamente interessados em aprender. O apóstolo diz que eles fizeram essa pergunta “tentando-o” (v. 3). É provável que eles estavam incomodados com o que Cristo tinha dito no Sermão do Monte. No Sermão do Monte, Cristo condenou os escribas e fariseus como falsos intérpretes da lei (Mateus 5:17-20) e ensinou que, segundo a lei de Deus, não é lícito ao homem repudiar sua mulher por qualquer motivo (v. 31-23). Jesus respondeu citando Gênesis, o primeiro livro de Moisés:
MATEUS 19
(4) Ele, porém, respondendo, disse-lhes: Não tendes lido que aquele que os fez no princípio macho e fêmea os fez,
(5) E disse: Portanto, deixará o homem pai e mãe, e se unirá a sua mulher, e serão dois numa só carne?
(6) Assim não são mais dois, mas uma só carne. Portanto, o que Deus ajuntou não o separe o homem.
É muito significativo que Jesus tenha respondido aos escribas e fariseus citando o livro de Moisés porque a intenção dos escribas e fariseus era provar que o ensino de Cristo no Sermao do Monte era contrário ao ensino de Moisés:
MATEUS 19
(7) Disseram-lhe eles: Então, por que mandou Moisés dar-lhe carta de divórcio, e repudiá-la?
Ao citar Moisés, Jesus estava provando que sua doutrina não era contrária a Moisés, mas estava em concordância com ele. Ou seja, os escribas e fariseus planejavam usar Moisés contra Jesus, mas Jesus antecipou o argumento deles e mostrou que Moisés, na verdade, estava contra eles. Moisés escreveu:
GÊNESIS 2
(21) Então o SENHOR Deus fez cair um sono pesado sobre Adão, e este adormeceu; e tomou uma das suas costelas, e cerrou a carne em seu lugar;
(22) E da costela que o SENHOR Deus tomou do homem, formou uma mulher, e trouxe-a a Adão.
(23) E disse Adão: Esta é agora osso dos meus ossos, e carne da minha carne; esta será chamada mulher, porquanto do homem foi tomada.
(24) Portanto deixará o homem o seu pai e a sua mãe, e apegar-se-á à sua mulher, e serão os dois uma só carne.
Adão não deixou o seu pai e a sua mãe para apegar-se à sua mulher porque ele não tinha pai e mãe. O que é dito no verso 24, então, “deixará o homem o seu pai e a sua mãe, e apegar-se-á à sua mulher, e serão os dois uma só carne“, só pode ser interpretado como uma lei para as gerações futuras. Em outras palavras, o que esse texto ensina é que quando Deus criou a mulher a partir da costela de Adão e fez com que os dois fossem marido e esposa, ele estabeleceu uma lei eterna para as futuras gerações de como o casamento deveria ser. Esse é o sentido da palavra “portanto” no verso 24. O que Deus fez nos versos 21-24 é a base para a lei do verso 24.
TODAS AS LEIS DO DECÁLOGO (OS DEZ MANDAMENTOS) SÃO FUNDAMENTADAS NA CRIAÇÃO
Gênesis 2 prova que o sétimo mandamento, “não adulterarás” (Êxodo 20:14), estava fundamentado na ordem da criação e na maneira com que a ordem da criação reflete a eterna natureza e vontade de Deus. O adultério é condenado porque Deus criou o casamento para que o homem e a mulher fossem uma só carne. O mesmo pode ser dito sobre todos os outros mandamentos do decálogo – os dez mandamentos (Êxodo 20). Todos estão fundamentados ordem da criação de Gênesis 1-3, que reflete a eterna natureza e vontade de Deus. Gênesis 1 revela que há um único Deus verdadeiro, que é o Criador dos Céus e da terra (Gênesis 1:1). Há, portanto, uma diferença essencial entre Deus e o universo. Como Deus criou o universo, Deus e o universo não se confundem. Deus criou o tempo (Gênesis 1:1,5). Por isso, Deus transcede a dimensão do tempo. Deus criou o sol, a lua e as estrelas (Gênesis 1:14-19). Por isso, o sol, a lua e as estrelas não são deuses. Deus criou os animais e os homens (Gênesis 1:20-31). Por isso, os animais não são deuses e o homem não é Deus. É com base nisso que o primeiro mandamento diz: “Não terás outros deuses diante de mim” (Êxodo 20:1). Não devemos ter outros deuses porque, como Gênesis 1 ensina, há um único Deus, que é diferente de tudo que há na criação. E como Moisés e Paulo também ensinaram, é por isso que o segundo mandamento nos proibe de fabricar imagens de Deus na forma das criaturas (Deuteronômio 4:15-19; Romanos 1:19-23). E se Deus é o Criador e soberano sobre todas as coisas, devemos reverenciar seu nome, não tomando seu nome em vão, que é o que ensina o terceiro mandamento (Êxodo 20:7). O quarto mandamento (Êxodo 20:8-11), que estabelece que deve santificar um dia em cada sete ao Senhor, está fundamentado no descanso de Deus depois de trabalhar por seis dias na obra da criação (Gênesis 2:1-3). O quinto mandamento (Êxodo 20:12), que ordena que honremos os nossos pais, está fundamentado na ordem natural de Gênesis 1: “E Deus os abençoou, e Deus lhes disse: Frutificai e multiplicai-vos” (Gênesis 1:28). O sexto mandamento, “não matarás”, está fundamentado no fato de que o homem foi criado à imagem de Deus (Gênesis 1:26), como o próprio Deus explicou para Noé (Gênesis 9:6). Além disso, podemos encontrar o sexto mandamento nas palavras de Deus a Adão: “E ordenou o SENHOR Deus ao homem, dizendo: De toda a árvore do jardim comerás livremente, mas da árvore do conhecimento do bem e do mal, dela não comerás; porque no dia em que dela comeres, certamente morrerás” (Gênesis 2:16). Se Deus ameaça Adão com a morte, infere-se que a morte é má, indesejavel e, portanto, que seria pecado matar. A partir das mesmas palavras, podemos inferir os três últimos mandamentos. Podemos inferir o oitavo mandamento (Êxodo 20:15), “não furtarás“, porque a proibição revela que Deus era o dono de tudo e, consequentemente, que Adão não tinha o direito de usufruir do que não pertencia a ele sem a autorização do dono. Esse é o significado de roubar: ususfruir do que não é seu sem a autorização do dono. Podemos inferir também o nono mandamento, que condena a mentira (Êxodo 20:16), pois Adão tinha a obrigação de crer que as palavras de Deus eram verdadeiras, o que é suficiente para provar que mentir é pecado. E no capítulo 3, a serpente foi condenada por mentir contra as palavras de Deus (Gênesis 3:4,14). E por último, podemos inferir o décimo mandamento, “não cobiçarás” (Êxodo 20:17), a partir das palavras de Gênesis 2:16 porque se Deus probiu Adão de comer do fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal, então ele não deveria desejar e cobiçar aquele fruto em seu coração: “E viu a mulher que aquela árvore era boa para se comer, e agradável aos olhos, e árvore desejável para dar entendimento; tomou do seu fruto, e comeu, e deu também a seu marido, e ele comeu com ela” (Gênesis 3:6).
LEIS CERIMONIAIS E LEIS CIVÍS
Enquanto o decálogo (os dez mandamentos) revela um padrão moral fundamentado na própria ordem da criação, isto é, na maneira que Deus criou o universo para ser, há outras leis que só são necessárias por causa da queda. Por exemplo, o assassinato é pecado porque Deus criou o homem à sua imagem (Gênesis 1:26-27; 9:6), mas a lei civil que estabelece a pena de morte só é necessária por causa da queda (Gênesis 9:6; Êxodo 21:12-14). Se não houvesse queda, o sexto mandamento seria sempre obedecido e, consequentemente, uma lei estabelecendo a pena de morte seria desnecessária. Além disso, se não houvesse queda, não haveria necessidade de salvação dos pecados. E se não houvesse necessidade de salvação dos pecados, não haveria necessidade de leis cerimoniais apontando para a obra da salvação. Por exemplo, Levítico 6 estabelece a seguinte lei para aqueles que eram culpados de violar o oitavo mandamento: “E a sua expiação trará ao SENHOR: um carneiro sem defeito do rebanho, conforme à tua estimação, para expiação da culpa trará ao sacerdote; e o sacerdote fará expiação por ela diante do SENHOR, e será perdoada de qualquer das coisas que fez, tornando-se culpada” (Levítico 6:6-7). Mas se não houvesse queda, o oitavo mandamento seria sempre obedecido e, consequentemente, uma lei estabelecendo um meio de expiação para o ladrão seria desnecessária.
Toda a lei dada por Moisés deve ser entendida assim. A lei moral, resumida no decálogo (Êxodo 20), revela o eterno padrão moral do SENHOR, fundamentado na ordem da criação, e as leis cerimoniais e civís revelavam como Israel deveria lidar com o problema do pecado depois que ele entrou no mundo. A lei moral lida primariamente com a seguinte questão: como as coisas devem ser segundo a ordem da criação? E as leis cerimoniais e civís lidam primariamente com a seguinte questão: o que devemos fazer mediante a entrada do pecado que distorceu a ordem da criação? Ou seja, as leis não lidam mais somente com um mundo em que tudo é “muito bom” (Gênesis 1:31). As leis agora lidam com um mundo caído.
A CARTA DE DIVÓRCIO: UMA LEI CÍVIL
A distinção entre a lei moral e as leis civís é crucial para entendermos a questão da carta de divórcio. Quando Moisés escreveu que “se dois homens pelejarem, ferindo-se um ao outro com pedra ou com o punho, e este não morrer, mas cair na cama” (Êxodo 21:18), e, em seguida, prescreve o que deveria ser feito em casos assim, isso não significa que a briga entre dois homens é moralmente bom. O que é bom é a paz entre os homens. Quando Moisés escreveu: “Quando houver contenda entre alguns, e vierem a juízo” (Deuteronômio 25:1), isso não significa que é bom que haja contenda entre as pessoas. Da mesma forma, o fato de Moisés escrever sobre o que fazer em caso de divórcio não significa que o divórcio seja bom. A briga, a contenda e o divórcio só existem porque Adão e Eva comeram do fruto do proibido. Se não houvesse pecado, não haveria divórcio. Por isso, a perpétua vontade de Deus para o casamento e para a sexualidade humana é a que encontramos em Gênesis 2:21-25 e, consequemente, a lei sobre a carta de divórcio só pode ser interpretada como um ato de divina concessão e tolerância que só faz sentido à luz da queda e da entrada do pecado no mundo, nunca como o ideal. Esse é o sentido das palavras de Jesus: “Disse-lhes ele: Moisés, por causa da dureza dos vossos corações” (Mateus 19:8). O sentido é que a lei do divórcio só existe por causa do pecado.
REGRA E EXCEÇÃO
Quando entendemos que o divórcio só existe por causa do pecado, que se não houvesse pecado não haveria divórcio, podemos entender porque Jesus ensinou que o divórcio só pode existir como exceção e nunca como regra. A regra do quinto mandamento é que os filhos devem honrar e obedecer aos pais (Êxodo 20:12; Efésios 6:1-3), mas uma exceção à regra é quando os pais ordenam que os filhos desobedeçam Jesus. Nesse caso, disse Jesus, quem “não aborrecer a seu pai, e mãe, e mulher, e filhos, e irmãos, e irmãs, e ainda também a sua própria vida, não pode ser meu discípulo” (Lucas 14:26). A regra do sexto mandamento é que não devemos matar o nosso próximo (Êxodo 20:13), mas uma exceção à regra é que, se alguém estiver tentando nos matar, nesse caso é lícito matar em legítima defesa (Êxodo 22:2-3). Moisés cita o caso de alguém invadindo uma residência à noite e diz que se o invasor morrer “o que o feriu não será culpado do sangue” (Êxodo 22:2).
Da mesma forma, se um homem e uma mulher são casados e um deles se relaciona com outra pessoa, isso é adultério, que é uma violação do sétimo mandamento (Êxodo 20:14). Por isso, Jesus disse: “Eu vos digo, porém, que qualquer que repudiar sua mulher… e casar com outra, comete adultério; e o que casar com a repudiada também comete adultério” (Mateus 19:9). Por que “comete adultério“? Porque, ainda que o marido tenha repudiado a mulher, eles continuam casados aos olhos de Deus. E se ainda estão casados aos olhos de Deus, é adultério se relacionar com outra pessoa. Essa é a regra do sétimo mandamento: se você está casado com uma pessoa, você não pode se relacionar com outra. E essa regra do sétimo mandamento, como toda a lei moral, está fundamentada na ordem da Criação: “Portanto deixará o homem o seu pai e a sua mãe, e apegar-se-á à sua mulher, e serão ambos uma carne” (Gênesis 2:24). Contudo, Jesus não apresentou somente uma regra. Ele apresentou também uma exceção: “Eu vos digo, porém, que qualquer que repudiar sua mulher, exceto por causa de relações sexuais ilícitas, e casar com outra, comete adultério” (Mateus 19:9). Quando ele diz, “exceto por”, ele está dizendo que esse caso é uma exceção à regra. A regra é que se você se casou com uma pessoa, você não pode se se separar daquela pessoa para se casar com outra. Se você se fizer isso, será um ato de adultério. A exeção são os casos de “relações sexuais ilícitas“. Nesses casos, quem repudiar sua mulher e casar com outra não comete adultério”. Esse é o significado de uma exceção. Significa que é um caso em que a regra geral não se aplica. Exemplos:
EXEMPLO 1
“Eu vos digo, porém, que qualquer que pegar o dinheiro da minha carteira, não sendo a minha esposa, será chamado de ladrão.”
Ou seja, se foi a minha esposa que pegou, ela não será chamada de ladra.
EXEMPLO 2
“Eu vos digo, porém, que qualquer que entrar na Casa Branca sem autorização prévia, não sendo alguém que trabalha lá, será chamado de invasor.”
Ou seja, se for alguém que trabalha lá, não será chamado de invasor.
Da mesma forma, quando Jesus disse “qualquer que repudiar sua mulher, exceto por causa de relações sexuais ilícitas, e casar com outra, comete adultério” (Mateus 19:9), isso significa que quem repudia seu cônjuge por causa de relações sexuais ilícitas e se casa com outra pessoa não comete adultério. Jesus fala sobre a regra, mas também fala sobre a exceção. A regra existe por causa da Criação e a exceção existe por causa da queda.
A CLÁUSULA DE EXCEÇÃO AUTORIZA O DIVÓRCIO, MAS NÃO O SEGUNDO CASAMENTO?
Alguns argumentam que a cláusula de exceção autoriza o divórcio em caso de relações sexuais ilícitas, mas não autoriza o segundo casamento. Mas isso contradiz as palavras de Jesus diretamente. Nas palavras de Jesus, a cláusula de exceção é uma exceção à proibição contra um segundo casamento. O argumento de Jesus sobre o adultério é dizer que contrair um novo casamento é adultério porque o primeiro casamento ainda está de pé. O argumento de Jesus é que se o casamento anterior não vigora mais, então o segundo casamento não é adultério. Se o argumento de Jesus é que o segundo casamento é adultério por causa do primeiro, não faz sentido dizer que a cláusula de exceção autoriza o término do primeiro casamento, mas não autoriza um novo casamento. Jesus não disse, “qualquer que repudiar sua mulher… comete adultério“, mas que “qualquer que repudiar sua mulher… e casar com outra, comete adultério“. Portanto, a exceção (“relações sexuais ilícitas”) é em relação ao segundo casamento. A exceção é a situação em que o segundo casamento é lícito. O segundo casamento não é adúltero exatamente porque, nesse caso, a parte inocente tem o direito de pedir o divórcio. Como a parte inocente tem o direito de pedir o divórcio, o casamento anterior deixa de vigorar aos olhos de Deus e, portanto, o segundo casamento não é adultério aos olhos de Deus. Para ficar ainda mais claro, poderíamos repetir a frase de Jesus mudando a posição da cláusula de exceção no final: “Qualquer que repudiar sua mulher, e casar com outra, comete adultério, exceto se for por causa de relações sexuais ilícitas.” Em caso de relações sexuais ilícitas, quem repudia sua mulher e casa com outra, não comete adultério.
O ADÚLTERO COLOCA A VIDA DO CÔNJUGE EM RISCO
Como já dissemos, embora o sexto mandamento proiba o homicídio (Êxodo 22:2), Deus nos autoriza a matar em caso de legítima defesa (Êxodo 22:2). O que muitos não se dão conta é que o adultério também coloca a vida do cônjuge em risco. Ao adulterar, o marido ou a esposa correm o risco de contrair uma doença sexualmente transmissível e de transmitir a doença ao cônjuge. Milhões de mulheres em todo o mundo se tornam aidéticas porque seus maridos saem com “amantes” e prostitutas. Além disso, muitas crianças nascem aidéticas por causa do adultério dos pais. Em outras palavras, o adultério não é só humilhante para a vítima. Todo adúltero é um assassino em potencial, pois todo adúltero pode estar levando doenças mortíferas para dentro de casa. Diante da seriedade do adultério, o ensino de Jesus é que, em um mundo cheio de pecadores, diferente do mundo que Deus criou em que tudo era “muito bom” (Gênesis 1:31), a vítima do adultério tem o direito de pedir o divórcio e se casar com outra pessoa (Mateus 19:9). Quando uma pessoa é ensinada que ela necessariamente tem que permanecer com o seu cônjuge, mesmo depois de traições, ela está literalmente sendo ensinada que ela tem que arriscar sua vida e que ela não tem o direito de se defender.
O QUE PAULO REALMENTE QUIS DIZER?
Alguns tentam negar o claro ensino de Jesus nos Evangelhos com base no que Paulo ensinou na epístola aos Romanos: “Ora, a mulher casada está ligada pela lei ao marido, enquanto ele vive; mas, se o mesmo morrer, desobrigada ficará da lei conjugal. De sorte que será considerada adúltera se, vivendo ainda o marido, unir-se com outro homem; porém, se morrer o marido, estará livre da lei e não será adúltera se contrair novas núpcias” (Romanos 7:2-3). A reposta é fácil. Aqui Paulo está falando da regra. O que ele ensina é equivalente ao que Jesus ensinou como regra: “Eu vos digo, porém, que qualquer que repudiar sua mulher… e casar com outra, comete adultério; e o que casar com a repudiada também comete adultério” (Mateus 19:9). Mas se Jesus ensinou que há uma exceção à regra, então quando Paulo repete a regra de Jesus, é incoerente crer que ele estava negando a exceção. Quando Jesus ensinou exatamente a mesma regra, isso não anulou a exceção. Como já mostramos, diversos mandamentos têm exceções.
Outra passagem que é utilizada para condenar todo segundo casamento é 1 Coríntios 7:
1 CORÍNTIOS 7
(1) Quanto ao que me escrevestes, é bom que o homem não toque em mulher;
(2) mas, por causa da impureza, cada um tenha a sua própria esposa, e cada uma, o seu próprio marido.
(3) O marido conceda à esposa o que lhe é devido, e também, semelhantemente, a esposa, ao seu marido.
(4) A mulher não tem poder sobre o seu próprio corpo, e sim o marido; e também, semelhantemente, o marido não tem poder sobre o seu próprio corpo, e sim a mulher.
(5) Não vos priveis um ao outro, salvo talvez por mútuo consentimento, por algum tempo, para vos dedicardes à oração e, novamente, vos ajuntardes, para que Satanás não vos tente por causa da incontinência.
(6) E isto vos digo como concessão e não por mandamento.
(7) Quero que todos os homens sejam tais como também eu sou; no entanto, cada um tem de Deus o seu próprio dom; um, na verdade, de um modo; outro, de outro.
(8) E aos solteiros e viúvos digo que lhes seria bom se permanecessem no estado em que também eu vivo.
(9) Caso, porém, não se dominem, que se casem; porque é melhor casar do que viver abrasado.
(10) Ora, aos casados, ordeno, não eu, mas o Senhor, que a mulher não se separe do marido
(11) (se, porém, ela vier a separar-se, que não se case ou que se reconcilie com seu marido); e que o marido não se aparte de sua mulher.
(12) Aos mais digo eu, não o Senhor: se algum irmão tem mulher incrédula, e esta consente em morar com ele, não a abandone;
(13) e a mulher que tem marido incrédulo, e este consente em viver com ela, não deixe o marido.
O verso 11 é citado para defender a interpretação de que a cláusula de exceção de Mateus 19:9 autoriza o divórcio em caso de relações sexuais ilícitas, mas não autoriza o segundo casamento. Mas isso é tirar o texto do contexto. No verso 10, o apóstolo diz: “ordeno, não eu, mas o Senhor“, mas no verso 12, ele diz: “digo eu, não o Senhor“. Por quê? O que ele ensina entre os versos 12-16 era sua mera opinião pessoal? O sentido não é esse. O sentido não é que, nos versos 10-11, ele ensina a Palavra de Deus, mas que, nos versos 12-16, ele ensina sua opinião pessoal. O sentido é que, nos versos 10-11, ele repete o que Jesus ensinou direta e explicitamente durante o seu ministério terreno, e que, nos versos 12-16, ele ensina algo que também é inspirado por Deus, que também é a Palavra de Deus, mas que Jesus não ensinou direta e explicitamente durante o seu ministério terreno. Em outras palavras, nos versos 10-11, Paulo está reafirmando o que Jesus ensinou direta e explicitamente em Mateus 19.
Nos versos 1-8, o apóstolo vinha recomendando a vida de celibato. Não vou entrar aqui em detalhes sobre as razões que ele dá para recomendar o celibato. Para este estudo, é suficiente perceber que, nos versos 1-8, ele recomenda o celibato. Contudo, ele não recomenda o celibato para todos. Sobre isso, é importante perceber que ele menciona diretamente três grupos específicos de pessoas – “os solteiros“, as “viúvas” e os “casados”:
1 CORÍNTIOS 7
(8) Digo, porém, aos solteiros e às viúvas, que lhes é bom se ficarem como eu.
(9) Mas, se não podem conter-se, casem-se. Porque é melhor casar do que abrasar-se.
É muito importante entender que o contexto aqui é a recomendação do celibato. Ele estava recomendando que as pessoas fossem celibatárias. No verso 8, ele faz essa recomendação aos solteiros e às viúvas. É nesse contexto, de recomendação ao celibato, que ele menciona os casados. Como Paulo estava recomendando o celibato, uma pessoa casada poderia dizer: “Se é assim, se Paulo está recomendando o celibato, então eu vou seguir a recomendação de Paulo e eu vou deixar o meu cônjuge”. Por isso, Paulo diz: “Digo, porém, aos solteiros e às viúvas, que lhes é bom se ficarem como eu… Todavia, aos casados mando, não eu mas o Senhor, que a mulher não se aparte do marido… e que o marido não se aparte de sua mulher.” (v. 8,10-11). Aqui Paulo está aplicando o que o Senhor Jesus ensinou em seu ministério terreno à questão do celibato. Ou seja, ele está dizendo que os solteiros e as viúvas poderiam seguir o seu conselho, mas que quem era casado não poderia. Por que não? Porque, como Jesus ensinou: “qualquer que repudiar sua mulher… e casar com outra, comete adultério; e o que casar com a repudiada também comete adultério” (Mateus 19:9). O que Paulo estava dizendo era que essa era a regra de Jesus para o casamento e o desejo de se tornar celibatário não era uma exceção autorizada por Jesus para essa regra. Os solteiros e as viúvas poderiam seguir sua recomendação e se tornar celibatários (verso 8), mas os casados não poderiam (versos 10-11). Por isso, ele diz no verso seguinte: “(se, porém, ela vier a separar-se, que não se case ou que se reconcilie com seu marido); e que o marido não se aparte de sua mulher” (v. 11). Claramente, Paulo está falando de alguém que se separa por razões injustificáveis, como para para se tornar um celibatário. O ensino de Jesus, que Paulo repete em 1 Coríntios 7, é que “qualquer que repudiar sua mulher, e casar com outra, comete adultério, exceto se for por causa de relações sexuais ilícitas” (Mateus 19:9) e, por isso, o que Paulo diz no verso 11 é aplicável aos casos de divórcio que violam a regra geral, como as pessoas que se separam para se tornar celibatárias, que é o caso específico que Paulo estava respondendo em 1 Coríntios 7. O que ele diz no verso 11 não é aplicável a quem se encaixa na cláusula de exceção. Por que não? Porque Paulo estava repetindo a regra de Mateus 19. Não estava ensinando a exceção.
NÃO SE COLOQUE EM POSIÇÕES DE RISCO
Em 1 Coríntios 7, Paulo ensina que a capacidade de ser celibatário é uma capacitação especial de Deus e que, aqueles que não tem esse dom, devem se casar:
1 CORÍNTIOS 7
(7) Quero que todos os homens sejam tais como também eu sou; no entanto, cada um tem de Deus o seu próprio dom; um, na verdade, de um modo; outro, de outro.
(8) E aos solteiros e viúvos digo que lhes seria bom se permanecessem no estado em que também eu vivo.
(9) Caso, porém, não se dominem, que se casem; porque é melhor casar do que viver abrasado.
Quando uma pessoa, que é vítima de adultério, é ensinada que ela não pode se casar novamente, ela está sendo ensinada a se colocar em uma posição muito arriscada. Se ela não tem o dom do celibato, essa pessoa vai “viver abrasada” e facilmente cairá em muitos pecados sexuais. Ou seja, além de ter sido vítima de um adultério, ela é erroneamente ensinada a rejeitar a maneira ordenada por Deus para lidar com seus desejos sexuais. Em outras palavras, ela é prejudicada duas vezes. Primeiro, pelo cônjuge que destruiu seu casamento. Segundo, por ensinos errados que não permitem que a vítima reconstrua sua vida depois de ter sua vida destruída.