Os Pastores Devem Usar Vestes Litúrgicas?

“E farás vestes sagradas a Arão teu irmão, para glória e ornamento.” (Êxodo 28:2)

Os pastores devem usar vestes litúrgicas? À luz das Sagradas Escrituras e da tradição da Igreja, eu creio que não devem usar.

O COMUM E O SAGRADO

A Bíblia ensina a diferenciar entre as coisas que são comuns e as coisas que são sagradas:

“Então falou o SENHOR a Moisés, dizendo: Santifica-me todo o primogênito, o que abrir toda a madre entre os filhos de Israel, de homens e de animais; porque meu é.” (Êxodo 13:1-2)

“E eu, eis que tenho tomado os levitas do meio dos filhos de Israel, em lugar de todo o primogênito, que abre a madre, entre os filhos de Israel; e os levitas serão meus. Porque todo o primogênito é meu; desde o dia em que tenho ferido a todo o primogênito na terra do Egito, santifiquei para mim todo o primogênito em Israel, desde o homem até ao animal: meus serão; Eu sou o SENHOR.” (Números 3:12-13)

“Também todas as dízimas do campo, da semente do campo, do fruto das árvores, são do SENHOR; santas são ao SENHOR.” (Levítico 27:30)

Em um sentido amplo, todos os homens, animais, sementes do campo e frutos das árvores pertencem a Deus, pois “do SENHOR é a terra e a sua plenitude, o mundo e aqueles que nele habitam” (Salmo 24:1). Ao mesmo tempo, em um sentido mais estrito, as coisas poderiam ser santificadas a Deus, o que significa dizer que pertenceriam a ele de uma maneira especial, de uma maneira exclusiva e diferenciada das demais coisas que são comuns, que não foram consagradas. As “dízimas do campo, da semente do campo, do fruto das árvores”, por exemplo, eram “santas ao Senhor”, isto é, eram do Senhor de maneira especial e por isso o homem não poderia consumi-las ou comercializá-las da mesma maneira que faria com o restante de seus alimentos.

No Novo Testamento, o mesmo princípio aplica-se à Ceia do Senhor. A palavra “ceia” refere-se a uma refeição. Em um sentido amplo, todos os alimentos e todas as refeições pertencem ao Senhor. Mas ao identificar uma ceia específica como sendo a Ceia do Senhor, a Bíblia está dizendo que essa ceia – essa refeição – pertence a ele de maneira especial. Ou seja, a Ceia do Senhor é uma refeição sagrada. Um dos problemas da igreja de Corinto é que eles não estavam diferenciando entre a ceia do Senhor, que era uma refeição sagrada, e as refeições comuns que eles comiam em casa (cf. 1 Coríntios 11:22, 27-29). O que pertence ao Senhor de maneira especial – aquilo que é sagrado – não pode ser tratado como coisa comum. O vinho e o pão que eu bebo e como na minha casa são alimentos comuns. O vinho e o pão que como e bebo na ocasião da Ceia são do Senhor. Ou seja, são alimentos sagrados, espirituais. Como explica a Confissão de Fé de Westminster:

“Nesta ordenança o Senhor Jesus constituiu seus ministros para declarar ao povo a sua palavra de instituição, orar, abençoar os elementos, pão e vinho, e assim separá-los do comum para um uso sagrado, tomar e partir o pão, tomar o cálice dele participando também e dar ambos os elementos aos comungantes e tão somente aos que se acharem presentes na congregação”. (Confissão de Westminster 29:3)

O mesmo pode ser dito sobre o pão que era utilizado nas cerimônias cúlticas do Antigo Testamento: “E, respondendo o sacerdote a Davi, disse: Não tenho pão comum à mão; há, porém, pão sagrado” (I Sam 21:4). Com base nesse princípio, a Bíblia exige que façamos distinção entre as coisas que são comuns e as coisas que são sagradas: “Os seus sacerdotes violentam a minha Lei, e profanam as minhas coisas santas; não fazem diferença entre o santo e o comum”. (Ezequiel 22:26)

AS VESTES SAGRADAS

Quando Moisés subiu ao monte para receber a revelação sobre o tabernáculo (Êxodo 24:18), Deus revelou a ele que os sacerdotes de Israel, no exercício do ofício sacerdotal, não deveriam utilizar vestes comuns, mas somente vestes sagradas:

ÊXODO 28
(1) Depois tu farás chegar a ti teu irmão Arão, e seus filhos com ele, do meio dos filhos de Israel, para me administrarem o ofício sacerdotal; a saber: Arão, Nadabe, e Abiú, Eleazar e Itamar, os filhos de Arão.
(2) E farás vestes sagradas a Arão teu irmão, para glória e ornamento.
(3) Falarás também a todos os que são sábios de coração, a quem eu tenho enchido do Espírito da sabedoria, que façam vestes a Arão para santificá-lo; para que me administre o ofício sacerdotal.
(4) Estas pois são as vestes que farão: um peitoral, e um éfode, e um manto, e uma túnica bordada, uma mitra, e um cinto; farão, pois, santas vestes para Arão, teu irmão, e para seus filhos, para me administrarem o ofício sacerdotal.
(5) E tomarão o ouro, e o azul, e a púrpura, e o carmesim, e o linho fino,
(6) E farão o éfode de ouro, e de azul, e de púrpura, e de carmesim, e de linho fino torcido, de obra esmerada.
(7) Terá duas ombreiras, que se unam às suas duas pontas, e assim se unirá.
(8) E o cinto de obra esmerada do seu éfode, que estará sobre ele, será da sua mesma obra, igualmente, de ouro, de azul, e de púrpura, e de carmesim, e de linho fino torcido.
(9) E tomarás duas pedras de ónix, e gravarás nelas os nomes dos filhos de Israel,
(10) Seis dos seus nomes numa pedra, e os outros seis nomes na outra pedra, segundo as suas gerações;
(11) Conforme à obra do lapidário, como o lavor de selos lavrarás estas duas pedras, com os nomes dos filhos de Israel; engastadas ao redor em ouro as farás.
(12) E porás as duas pedras nas ombreiras do éfode, por pedras de memória para os filhos de Israel; e Arão levará os seus nomes sobre ambos os seus ombros, para memória diante do SENHOR.
(13) Farás também engastes de ouro,
(14) E duas cadeiazinhas de ouro puro; de igual medida, de obra de fieira as farás; e as cadeiazinhas de fieira porás nos engastes.
(15) Farás também o peitoral do juízo de obra esmerada, conforme à obra do éfode o farás; de ouro, de azul, e de púrpura, e de carmesim, e de linho fino torcido o farás.
(16) Quadrado e duplo, será de um palmo o seu comprimento, e de um palmo a sua largura.
(17) E o encherás de pedras de engaste, com quatro ordens de pedras; a ordem de um sárdio, de um topázio, e de um carbúnculo; esta será a primeira ordem;
(18) E a segunda ordem será de uma esmeralda, de uma safira, e de um diamante;
(19) E a terceira ordem será de um jacinto, de uma ágata, e de uma ametista;
(20) E a quarta ordem será de um berilo, e de um ónix, e de um jaspe; engastadas em ouro serão nos seus engastes.
(21) E serão aquelas pedras segundo os nomes dos filhos de Israel, doze segundo os seus nomes; serão esculpidas como selos, cada uma com o seu nome, para as doze tribos.
(22) Também farás para o peitoral cadeiazinhas de igual medida, obra trançada de ouro puro.
(23) Também farás para o peitoral dois anéis de ouro, e porás os dois anéis nas extremidades do peitoral.
(24) Então porás as duas cadeiazinhas de fieira de ouro nos dois anéis, nas extremidades do peitoral;
(25) E as duas pontas das duas cadeiazinhas de fieira colocarás nos dois engastes, e as porás nas ombreiras do éfode, na frente dele.
(26) Farás também dois anéis de ouro, e os porás nas duas extremidades do peitoral, na sua borda que estiver junto ao éfode por dentro.
(27) Farás também dois anéis de ouro, que porás nas duas ombreiras do éfode, abaixo, na frente dele, perto da sua juntura, sobre o cinto de obra esmerada do éfode.
(28) E ligarão o peitoral, com os seus anéis, aos anéis do éfode por cima, com um cordão de azul, para que esteja sobre o cinto de obra esmerada do éfode; e nunca se separará o peitoral do éfode.
(29) Assim Arão levará os nomes dos filhos de Israel no peitoral do juízo sobre o seu coração, quando entrar no santuário, para memória diante do SENHOR continuamente.
(30) Também porás no peitoral do juízo Urim e Tumim, para que estejam sobre o coração de Arão, quando entrar diante do SENHOR: assim Arão levará o juízo dos filhos de Israel sobre o seu coração diante do SENHOR continuamente.
(31) Também farás o manto do éfode, todo de azul.
(32) E a abertura da cabeça estará no meio dele; esta abertura terá uma borda de obra tecida ao redor; como abertura de cota de malha será, para que não se rompa.
(33) E nas suas bordas farás romãs de azul, e de púrpura, e de carmesim, ao redor das suas bordas; e campainhas de ouro no meio delas ao redor.
(34) Uma campainha de ouro, e uma romã, outra campainha de ouro, e outra romã, haverá nas bordas do manto ao redor,
(35) E estará sobre Arão quando ministrar, para que se ouça o seu sonido, quando entrar no santuário diante do SENHOR, e quando sair, para que não morra.
(36) Também farás uma lâmina de ouro puro, e nela gravarás como as gravuras de selos: SANTIDADE AO SENHOR.
(37) E ata-la-ás com um cordão de azul, de modo que esteja na mitra, na frente da mitra estará;
(38) E estará sobre a testa de Arão, para que Arão leve a iniqüidade das coisas santas, que os filhos de Israel santificarem em todas as ofertas de suas coisas santas; e estará continuamente na sua testa, para que tenham aceitação perante o SENHOR.
(39) Também farás túnica de linho fino; também farás uma mitra de linho fino; mas o cinto farás de obra de bordador.
(40) Também farás túnicas aos filhos de Arão, e far-lhes-ás cintos; também lhes farás tiaras, para glória e ornamento.
(41) E vestirás com eles a Arão, teu irmão, e também seus filhos; e os ungirás e consagrarás, e os santificarás, para que me administrem o sacerdócio.
(42) Faze-lhes também calções de linho, para cobrirem a carne nua; irão dos lombos até as coxas.
(43) E estarão sobre Arão e sobre seus filhos, quando entrarem na tenda da congregação, ou quando chegarem ao altar para ministrar no santuário, para que não levem iniqüidade e morram; isto será estatuto perpétuo para ele e para a sua descendência depois dele.

Aqui nós lemos que Arão e seus filhos foram separados para exercer um ofício sagrado. No exercício desse ofício sagrado, eles deveriam usar vestes sagradas. Como essas vestes eram sagradas, as pessoas não tinham liberdade para fazer o tipo de veste que quisessem. No caso de uma refeição comum, o homem tem muita liberdade para escolher o que ele quer comer, mas no caso das refeições sagradas (como a Ceia Pascal do Velho Testamento e a Ceia do Senhor do Novo Testamento), o homem tem que comer exatamente o que Deus manda comer (cf. Deuteronômio 12:8). Semelhantemente, no caso das vestes comuns, o homem tem liberdade para escolher como ele quer vestir, mas no caso das vestes sagradas, Arão e seus filhos tinham que se vestir exatamente da maneira que Deus mandou. Por quê? Porque o que é sagrado pertence ao Senhor de maneira especial, sendo regulado por ele de maneira mais estrita e direta. Por isso, em Êxodo 28, o Senhor diz exatamente como as vestes de Arão tinham que ser.

COSTUREIROS INSPIRADOS

Não era suficiente que as vestes de Arão fossem exatamente da maneira que Deus revelou a Moisés. Elas tinham que ser confeccionadas por pessoas divinamente inspiradas:

ÊXODO 28
(3) Falarás também a todos os que são sábios de coração, a quem eu tenho enchido do Espírito da sabedoria, que façam vestes a Arão para santificá-lo; para que me administre o ofício sacerdotal.

ÊXODO 31
(1) Depois falou o SENHOR a Moisés, dizendo:
(2) Eis que eu tenho chamado por nome a Bezalel, o filho de Uri, filho de Hur, da tribo de Judá,
(3) E o enchi do Espírito de Deus, de sabedoria, e de entendimento, e de ciência, em todo o lavor,
(4) Para elaborar projetos, e trabalhar em ouro, em prata, e em cobre,
(5) E em lapidar pedras para engastar, e em entalhes de madeira, para trabalhar em todo o lavor.
(6) E eis que eu tenho posto com ele a Aoliabe, o filho de Aisamaque, da tribo de Dã, e tenho dado sabedoria ao coração de todos aqueles que são hábeis, para que façam tudo o que te tenho ordenado.
(7) A saber: a tenda da congregação, e a arca do testemunho, e o propiciatório que estará sobre ela, e todos os pertences da tenda;
(8) E a mesa com os seus utensílios, e o candelabro de ouro puro com todos os seus pertences, e o altar do incenso;
(9) E o altar do holocausto com todos os seus utensílios, e a pia com a sua base;
(10) E as vestes do ministério, e as vestes sagradas de Arão o sacerdote, e as vestes de seus filhos, para administrarem o sacerdócio;
(11) E o azeite da unção, e o incenso aromático para o santuário; farão conforme a tudo que te tenho mandado.

É importante perceber que esses homens divinamente inspirados não foram inspirados para construir e fazer qualquer coisa. Eles foram cheios do Espírito Santo para construir o santuário e para fazer todas as coisas relacionadas ao santuário (incluindo as vestes sacerdotais) segundo o modelo que Deus revelou: “Eles farão tudo segundo tenho ordenado” (Êxodo 31:11). Quando Arão morreu, ele foi sucedido por seu filho Eleazar. Para que ele exercesse o sacerdócio, ele teve que usar a mesma veste que Arão usava:

“E falou o SENHOR a Moisés e a Arão no monte Hor, nos termos da terra de Edom, dizendo: Arão será recolhido a seu povo, porque não entrará na terra que tenho dado aos filhos de Israel, porquanto rebeldes fostes à minha ordem, nas águas de Meribá. Toma a Arão e a Eleazar, seu filho, e faze-os subir ao monte Hor. E despe a Arão as suas vestes, e veste-as em Eleazar, seu filho, porque Arão será recolhido, e morrerá ali. Fez, pois, Moisés como o SENHOR lhe ordenara; e subiram ao monte Hor perante os olhos de toda a congregação. E Moisés despiu a Arão de suas vestes, e as vestiu em Eleazar, seu filho; e morreu Arão ali sobre o cume do monte; e desceram Moisés e Eleazar do monte”. (Número 20:23-28)

Por que Eleazar teve que usar a mesma veste que era usada por Arão? Porque aquela veste específica era divinamente inspirada. Sendo assim, eles não poderiam, sem ordem direta de Deus, simplesmente mandar qualquer um confeccionar outra (mesmo que a outra seguisse o mesmo modelo que foi revelado a Moisés). Tinha que ser a mesma que Arão usava porque a que ele usava foi confeccionada pela obra do Espírito de Deus (Êxodo 31:3,6,10).

Se as vestes sacerdotais eram divinamente inspiradas, segue-se que elas eram meios de graça. Ou seja, diferente das vestes comuns, que não são divinamente inspiradas, essas vestes sagradas faziam parte de um simbolismo espiritual que era eficazmente utilizado pelo Espírito de Deus para edificar o adorador (cf. Hebreus 9). Por isso, se alguém utilizasse vestes não inspiradas, vestes não sagradas, tais vestes não teriam o mesmo efeito de edificação espiritual para o adorador. Por isso, era importante que Eleazar utilizasse as vestes de Arão.

IMITAÇÕES ILEGÍTIMAS

Um dos pecados de Gideão foi criar uma imitação ilegítima de uma peça que fazia parte das vestes sacerdotais: “E fez Gideão dele um éfode, e colocou-o na sua cidade, em Ofra; e todo o Israel prostituiu-se ali após ele; e foi por tropeço a Gideão e à sua casa” (Juízes 8:27). Aqui é importante lembrar que a Bíblia descreve Gideão como um verdadeiro crente (Hebreus 11:32). Isso mostra que é possível que um verdadeiro irmão cometa erros que são espiritualmente prejudiciais para o povo de Deus. Ele era um verdadeiro irmão, mas o seu pecado “foi por tropeço a Gideão e à sua casa” e “todo o Israel prostituiu-se ali após ele“. Isso serve de alerta para nós. Até os melhores homens podem errar. O erro de Gideão foi confeccionar uma parte da veste sacerdotal:

ÊXODO 28
(4) Estas pois são as vestes que farão: um peitoral, e um éfode, e um manto, e uma túnica bordada, uma mitra, e um cinto; farão, pois, santas vestes para Arão, teu irmão, e para seus filhos, para me administrarem o ofício sacerdotal.

Por que Gideão não poderia fazer um éfode se Êxodo 28:4 mandava fazer um éfode? Primeiro, porque a ordem de fazer não foi dada especificamente para Gideão. Segundo, porque para fazer, era necessário uma inspiração especial do Espírito Santo: “Falarás também a todos os que são sábios de coração, a quem eu tenho enchido do Espírito da sabedoria, que façam vestes a Arão para santificá-lo; para que me administre o ofício sacerdotal” (Êxodo 28:3). Isso mostra a importância de ler os mandamentos bíblicos em seu devido contexto. Se uma capacitação especial do Espírito era necessária para confeccionar essas vestes, a tentativa de confeccioná-las sem a mesma inspiração era uma imitação ilegítima da obra do Espírito Santo e, portanto, seria pecado.

Ao mesmo tempo, é importante lembrar que Gideão somente pecou porque o éfode fazia parte de uma veste sagrada. O que é sagrado pertence ao Senhor de maneira especial, sendo regulado por ele de maneira mais estrita e direta. No caso das vestes comuns, não é necessário que tenhamos costureiros inspirados pelo Espírito Santo. Em outras palavras, se Gideão tivesse inventado uma nova peça de roupa comum, ele não teria cometido pecado. Gideão não precisava de uma ordem direta de Deus para cada peça de roupa que ele quisesse usar. Isso reforça o que dissemos na primeira parte deste estudo, sobre a importância de diferenciar entre o que é comum e o sagrado.

A AB-ROGAÇÃO DAS VESTES SACERDOTAIS

As vestes sacerdotais faziam parte do sistema de culto da aliança mosaica.  Antes de Êxodo 28, o SENHOR não tinha dado nenhuma ordem sobre o uso de vestes sacerdotais. Por isso, devemos presumir que aqueles que exerceram o ofício sacerdotal antes de Êxodo 28 não usavam vestes sagradas (Êxodo 19:22, 24).  Se o sacerdócio levítico instituído por Moisés foi substituído pelo sacerdócio de Cristo segundo a ordem de Melquisedeque (Salmo 110:4; Hebreus 7:11-28), segue-se que as vestes sacerdotais da aliança mosaica que faziam parte do sacerdócio levítico foram ab-rogadas por Deus mediante o estabelecimento da nova aliança (cf. Hebreus 9).

“De sorte que, se a perfeição fosse pelo sacerdócio levítico (porque sob ele o povo recebeu a lei), que necessidade havia logo de que outro sacerdote se levantasse, segundo a ordem de Melquisedeque, e não fosse chamado segundo a ordem de Arão?” (Hebreus 7:11)

As vestes sacerdotais de Êxodo 28 eram as vestes sacerdotais ordenadas especificamente para os sacerdotes levitas.  Quando Gideão, que não era levita ou sacerdote, tentou transferir para si mesmo o que era para os sacerdotes levitas, ele pecou. Aqueles que não são sacerdotes levitas não poderiam usar as mesmas vestes que eles usavam. Como o sacerdócio levítico foi ab-rogado por Deus, ninguém mais pode usá-las.

DEUS NÃO DEU NOVAS VESTES SAGRADAS

Sob a aliança mosaica, quando Deus escolheu Arão e seus filhos para que fossem sacerdotes, ele explicou qual era a função dos sacerdotes:

LEVÍTICO 10
(8) E falou o SENHOR a Arão, dizendo:
(9) Não bebereis vinho nem bebida forte, nem tu nem teus filhos contigo, quando entrardes na tenda da congregação, para que não morrais; estatuto perpétuo será isso entre as vossas gerações;
(10) E para fazer diferença entre o sagrado e o comum e entre o imundo e o limpo,
(11) E para ensinar aos filhos de Israel todos os estatutos que o SENHOR lhes tem falado por meio de Moisés

Ou seja, os sacerdotes levitas foram escolhidos para ensinar a Bíblia e para administrar as cerimônias religiosas do templo. No exercício dessas funções, eles tinham que usar as vestes sagradas.

Sob a nova aliança, Jesus Cristo escolheu apóstolos e deu a eles uma missão (Mateus 10; Mateus 28:17-20). Além disso, ele escolhe os pastores e também dá a eles uma missão (Efésios 4:8-14), que é ensinar a Bíblia e administrar as cerimônias da nova aliança (o batismo e a Ceia do Senhor). Contudo, para o exercício dessas funções, ele não determinou nenhuma veste sagrada que os apóstolos ou os pastores teriam que usar. Isso se torna muito claro quando comparamos as passagens da aliança mosaica que falam sobre a escolha dos levitas com as passagens que falam sobre a escolha dos apóstolos ou dos pastores do Novo Testamento. Quando a Bíblia fala sobre o que os sacerdotes levitas precisavam fazer para exercer o ofício sacerdotal, é dito, entre outras coisas, que eles precisavam utilizar roupas sagradas. Quando a Bíblia fala sobre o que os apóstolos e pastores precisavam fazer para exercer o ofício apostólico e pastoral, não é dito nada sobre vestes sagradas que eles precisariam utilizar. Se Cristo não determinou nenhuma veste sagrada que os apóstolos ou os pastores teriam que usar, então os apóstolos e os pastores deveriam utilizar vestes comuns.

CRISTO, A CABEÇA

A razão pela qual os israelitas não tinham autoridade para inventar coisas sagradas é que Cristo era a cabeça de Israel (Jeremias 2:2; 31:32; Ezequiel 16:8), como já explicamos em outro artigo. Como Cristo, que é Jeová – o Deus de Abraão, Isaque e Jacó – era a cabeça de Israel, tudo o que os israelitas faziam em relação ao culto e ao serviço espiritual a Deus tinha que ser determinado por Cristo. “Conforme a tudo o que o SENHOR ordenara a Moisés, assim fizeram os filhos de Israel toda a obra” (Êxodo 39:42). “Tudo o que eu te ordeno, observarás para fazer; nada lhe acrescentarás nem diminuirás” (Deuteronômio 12:32). Os apóstolos ensinaram que isso continua a ser verdade mesmo depois do estabelecimento da nova aliança. Por quê? Porque mesmo depois da encarnação do Verbo e do estabelecimento da nova aliança, Cristo, o noivo, continua sendo a cabeça de seu povo:

COLOSSENSES 2
(6) Como, pois, recebestes o Senhor Jesus Cristo, assim também andai nele,
(7) Arraigados e edificados nele, e confirmados na fé, assim como fostes ensinados, nela abundando em ação de graças.
(8) Tende cuidado, para que ninguém vos faça presa sua, por meio de filosofias e vãs sutilezas, segundo a tradição dos homens, segundo os rudimentos do mundo, e não segundo Cristo;
(9) Porque nele habita corporalmente toda a plenitude da divindade;
(10) E estais perfeitos nele, que é a cabeça de todo o principado e potestade;
(11) No qual também estais circuncidados com a circuncisão não feita por mão no despojo do corpo dos pecados da carne, a circuncisão de Cristo;
(12) Sepultados com ele no batismo, nele também ressuscitastes pela fé no poder de Deus, que o ressuscitou dentre os mortos.
(13) E, quando vós estáveis mortos nos pecados, e na incircuncisão da vossa carne, vos vivificou juntamente com ele, perdoando-vos todas as ofensas,
(14) Havendo riscado a cédula que era contra nós nas suas ordenanças, a qual de alguma maneira nos era contrária, e a tirou do meio de nós, cravando-a na cruz.
(15) E, despojando os principados e potestades, os expôs publicamente e deles triunfou em si mesmo.
(16) Portanto, ninguém vos julgue pelo comer, ou pelo beber, ou por causa dos dias de festa, ou da lua nova, ou dos sábados,
(17) Que são sombras das coisas futuras, mas o corpo é de Cristo.
(18) Ninguém vos domine a seu bel-prazer com pretexto de humildade e culto dos anjos, envolvendo-se em coisas que não viu; estando debalde inchado na sua carnal compreensão,
(19) E não ligado à cabeça, da qual todo o corpo, provido e organizado pelas juntas e ligaduras, vai crescendo em aumento de Deus.
(20) Se, pois, estais mortos com Cristo quanto aos rudimentos do mundo, por que vos carregam ainda de ordenanças, como se vivêsseis no mundo, tais como:
(21) Não toques, não proves, não manuseies?
(22) As quais coisas todas perecem pelo uso, segundo os preceitos e doutrinas dos homens;
(23) As quais têm, na verdade, alguma aparência de sabedoria, em devoção voluntária, humildade, e em disciplina do corpo, mas não são de valor algum senão para a satisfação da carne.

Aqui o apóstolo Paulo fala sobre a ab-rogação da forma externa de adoração do Velho Testamento. A circuncisão foi ab-rogada (v. 11) e o culto do templo de Jerusalém também foi (v. 16). Contudo, o povo de Deus não recebeu liberdade para inventar o que quisesse. A circuncisão foi substituída pelo batismo (v. 12-12) e o templo de Jerusalém, que era o lugar da habitação especial de Deus (Êxodo 25:9), foi substituído por Cristo (v. 9) e pela Igreja, o povo que está em Cristo e o tem como cabeça (v. 19). Essa substituição já havia sido profetizado por Jeremias.

Imediatamente depois de falar sobre ab-rogação da forma de adoração do Velho Testamento, o apóstolo fala contra aqueles que, no tempo do Novo Testamento, querem introduzir formas de servir a Deus sem mandamento da Palavra de Deus. Esse é o sentido das palavras do verso 22: “segundo os preceitos e doutrinas dos homens“. Paulo fala sobre os preceitos e doutrinas dos homens de maneira negativa da mesma forma que o próprio Cristo fez: “Mas, em vão me adoram, ensinando doutrinas que são preceitos dos homens” (Mateus 15:9). Como está escrito também no Velho Testamento, no livro de Isaías: “Porque o Senhor disse: Pois que este povo se aproxima de mim, e com a sua boca, e com os seus lábios me honra, mas o seu coração se afasta para longe de mim e o seu temor para comigo consiste só em mandamentos de homens, em que foi instruído” (Isaías 29:13). O princípio, tanto no Velho quanto no Novo Testamento, é claramente o mesmo: é inaceitável tudo o que os homens inventam como forma de servir a Deus sem a ordem do próprio Deus. Esse princípio não pode ter sido anulado no tempo do Novo Testamento porque Paulo falou sobre o mesmo princípio imediatamente depois de falar sobre o fim da forma externa de adoração do Velho Testamento. Além disso, a razão dada por Paulo (Colossenses 2:19) é a mesma que do Velho Testamento: que o Senhor é a cabeça de seu povo. Se uma determinada veste é utilizada como veste sagrada, como parte do serviço a Deus, tendo um significado espiritual, ela precisa ter sido santificada pelo próprio Deus e produzida por inspiração de seu Espírito (Êxodo 28:3; 31:1-11).

CUMPRINDO A LEI E OS PROFETAS

Jesus disse: “Não cuideis que vim destruir a lei ou os profetas: não vim ab-rogar, mas cumprir” (Mateus 5:17). Ele fez questão de enfatizar que todos os detalhes da lei, por menor que possam parecer, são importantes e devem ser cumpridos: “Porque em verdade vos digo que, até que o céu e a terra passem, nem um jota ou um til se omitirá da lei, sem que tudo seja cumprido. Qualquer, pois, que violar um destes mandamentos, por menor que seja, e assim ensinar aos homens, será chamado o menor no reino dos céus; aquele, porém, que os cumprir e ensinar será chamado grande no reino dos céus” (Mateus 5:18-19). Mas se isso for verdade, isso não contradiz o que foi dito neste estudo, que o sacerdócio levítico foi ab-rogado e, consequentemente, que as vestes sacerdotais também foram ab-rogadas? A epístola aos Hebreus foi escrita para explicar essa aparente discrepância:

HEBREUS 9
(1) Ora, também a primeira [aliança] tinha ordenanças de culto divino, e um santuário terrestre.
(2) Porque um tabernáculo estava preparado, o primeiro, em que havia o candelabro, e a mesa, e os pães da proposição; ao que se chama o santuário.
(3) Mas depois do segundo véu estava o tabernáculo que se chama o santo dos santos,
(4) Que tinha o incensário de ouro, e a arca da aliança, coberta de ouro toda em redor; em que estava um vaso de ouro, que continha o maná, e a vara de Arão, que tinha florescido, e as tábuas da aliança;
(5) E sobre a arca os querubins da glória, que faziam sombra no propiciatório; das quais coisas não falaremos agora particularmente.
(6) Ora, estando estas coisas assim preparadas, a todo o tempo entravam os sacerdotes no primeiro tabernáculo, cumprindo os serviços;
(7) Mas, no segundo, só o sumo sacerdote, uma vez no ano, não sem sangue, que oferecia por si mesmo e pelas culpas do povo;
(8) Dando nisto a entender o Espírito Santo que ainda o caminho do santuário não estava descoberto enquanto se conservava em pé o primeiro tabernáculo,
(9) Que é uma alegoria para o tempo presente, em que se oferecem dons e sacrifícios que, quanto à consciência, não podem aperfeiçoar aquele que faz o serviço;
(10) Consistindo somente em comidas, e bebidas, e várias abluções e justificações da carne, impostas até ao tempo da correção.
(11) Mas, vindo Cristo, o sumo sacerdote dos bens futuros, por um maior e mais perfeito tabernáculo, não feito por mãos, isto é, não desta criação,
(12) Nem por sangue de bodes e bezerros, mas por seu próprio sangue, entrou uma vez no santuário, havendo efetuado uma eterna redenção.
(13) Porque, se o sangue dos touros e bodes, e a cinza de uma novilha esparzida sobre os imundos, os santifica, quanto à purificação da carne,
(14) Quanto mais o sangue de Cristo, que pelo Espírito eterno se ofereceu a si mesmo imaculado a Deus, purificará as vossas consciências das obras mortas, para servirdes ao Deus vivo?
(15) E por isso é Mediador de um novo testamento, para que, intervindo a morte para remissão das transgressões que havia debaixo do primeiro testamento, os chamados recebam a promessa da herança eterna.
(16) Porque onde há testamento, é necessário que intervenha a morte do testador.
(17) Porque um testamento tem força onde houve morte; ou terá ele algum valor enquanto o testador vive?
(18) Por isso também o primeiro não foi consagrado sem sangue;
(19) Porque, havendo Moisés anunciado a todo o povo todos os mandamentos segundo a lei, tomou o sangue dos bezerros e dos bodes, com água, lã purpúrea e híssope, e aspergiu tanto o mesmo livro como todo o povo,
(20) Dizendo: Este é o sangue do testamento que Deus vos tem mandado.
(21) E semelhantemente aspergiu com sangue o tabernáculo e todos os vasos do ministério.
(22) E quase todas as coisas, segundo a lei, se purificam com sangue; e sem derramamento de sangue não há remissão.
(23) De sorte que era bem necessário que as figuras das coisas que estão no céu assim se purificassem; mas as próprias coisas celestiais com sacrifícios melhores do que estes.
(24) Porque Cristo não entrou num santuário feito por mãos, figura do verdadeiro, porém no mesmo céu, para agora comparecer por nós perante a face de Deus;
(25) Nem também para a si mesmo se oferecer muitas vezes, como o sumo sacerdote cada ano entra no santuário com sangue alheio;
(26) De outra maneira, necessário lhe fora padecer muitas vezes desde a fundação do mundo. Mas agora na consumação dos séculos uma vez se manifestou, para aniquilar o pecado pelo sacrifício de si mesmo.
(27) E, como aos homens está ordenado morrerem uma vez, vindo depois disso o juízo,
(28) Assim também Cristo, oferecendo-se uma vez para tirar os pecados de muitos, aparecerá segunda vez, sem pecado, aos que o esperam para salvação.

Aqui é dito que a forma da aliança mosaica de servir ao Senhor não foi inventada por homens, mas foi dada pelo Espírito Santo (v. 8), o que já tinha sido enfatizado pelo próprio Moisés (Êxodo 31:3; 35:31). É dito também que a forma da aliança mosaica de servir ao Senhor foi dada com a intenção de representar simbolicamente a pessoa e a obra de Cristo no tempo do Novo Testamento. Que essa era a intenção de Deus desde o tempo de Moisés está claro a partir do que o apóstolo diz quando ele explica que o sistema cerimonial mosaico foi dado como “uma alegoria para o tempo presente” (v. 9). O “tempo presente” é o tempo do Novo Testamento. Por isso, ele também chama os elementos do serviço mosaico de “figuras(v. 23) dos “bem futuros(v. 11)futuros em relação ao tempo de Moisés. Isso significa que não é suficiente crer que esses elementos exteriores do serviço mosaico foram ab-rogados. É necessário crer que, embora tenham sido ab-rogados quanto à forma externa, nós continuamos a ter a realidade espiritual que essas coisas significavam. Em outras palavras, não é suficiente crer que não temos mais o “sangue de bodes e bezerros” (Hebreus 9:13). É necessário crer que o sangue dos bodes e bezerros eram “alegoria(v. 9), “figuras(v. 23) e “sombra” do sangue de Cristo (Hebreus 10:1). Por isso, não contradição entre a ab-rogação do serviço mosaico e as palavras de Cristo: “Porque em verdade vos digo que, até que o céu e a terra passem, nem um jota ou um til se omitirá da lei, sem que tudo seja cumprido” (Mateus 5:18). Não há contradição porque não há uma ab-rogação em todos os sentidos, mas somente quanto à forma externa, para dar lugar ao cumprimento das realidades espirituais que aquelas coisas significavam como “sombra dos bens futuros” (Hebreus 10:1).

Isso significa que as vestes sagradas dos sacerdotes levitas eram “alegoria” (Hebreus 9:9), “figuras” (9:23) e “sombra” (10:1) de realidades espirituais que continuam a vigorar sob a nova aliança. Ora, se foi da vontade de Deus que essas vestes fossem ab-rogadas para que, sob a nova aliança, fossem enfatizadas as realidades espirtiuais que eram representadas por aquelas vestes, qual é o sentido de inventar novas vestes sagradas que Deus não ordenou e que não são inspiradas pelo Espírito Santo? Hebreus 9 deixa claro que as vestes sagradas do serviço mosaico, com suas características alegóricas e figuradas, foram substituídas pela revelação do significado espiritual daqueles vestes. Não foram substituídas por novas vestes com características alegóricas e figuradas, muito menos por vestes com um sistema de simbolismo espiritual inventado pelos homens (Colossenses 2:22).

Se as vestes sagradas dos sacerdotes levitas foram originalmente dadas pelo Espírito Santo como “alegoria” (Hebreus 9:9), “figuras” (9:23) e “sombra” (10:1), dos “bem futuros” (9:11), segue-se que para guardarmos para cada “jota” e cada “til” (Mateus 5:18) da Lei, precisamos guardar estritamente as realidades espirituais que, desde o princípio, eram representadas por aquelas vestes. Se invetarmos maneiras diferentes de guardar as leis que falam sobre essas vestes – inventando vestes novas – não estaremos guardando as leis de Deus sobre as vestes sacerdotais levíticas da maneira que Hebreus 9 diz que devemos guardar. Como bem escreveu João Calvino:

“Em relação à doutrina, não devemos imaginar que a vinda de Cristo nos livrou da autoridade da Lei. Pois a Lei é a regra de uma vida devota e santa e, portanto, é tão imutável quanto a justiça de Deus que ela revela, sendo constante e uniforme. Em relação às cerimonias, há alguma aparência de mudança, mas foi somente o uso das cerimonias que foi abolido, pois o significado foi ainda mais confirmado. A vinda de Cristo não retirou nada mesmo das cerimonias, mas, ao contrário, confirmou-as ainda mais ao exibir a verdade das sombras, pois quando vemos seu efeito completo, reconhecemos que não são vãs ou inúteis.” (João Calvino, A Harmonia dos Evangelhos, Comentário de Mateus 5:17-19)

AS EVIDÊNCIAS DA TRADIÇÃO DA IGREJA

O que eu defendi neste estudo pode ser confirmado a partir das evidências da tradição da Igreja ao longo dos séculos de duas maneiras principais:

1. Nos primeiros séculos da Igreja, os pastores – bispos e presbíteros – da Igreja não utilizavam vestes sagradas, mas somente vestes comuns. Isso é reconhecido até mesmo por historiadores católicos romanos (que são os que normalmente dão mais ênfase à importância das vestes litúrgicas). Segundo a enciclopédia católica romana “New Advent“, os líderes da Igreja dos primeiros séculos não utilizavam qualquer tipo de veste sagrada. Aliás, segundo a mesma enciclopédia, a mitra só começou a ser utilizada no século 10. Por isso, todas pinturas que retratam os Pais da Igreja (como Agostinho, Atanásio ou os bispos de Nicéia) com uma mitra na cabeça são anacrônicas. Essas pinturas retratam os Pais da Igreja usando vestes que não eram realmente utilizadas no tempo deles. Os bispos de Nicéia, na verdade, utilizavam vestes comuns do mundo grego-romano. Isso prova que a mais antiga tradição da Igreja é a tradição de não utilizar vestes sagradas. O uso de vestes sagradas foi uma inovação posterior. Não tem origem na tradição dos apóstolos (2 Tessaloniscenses 3:6). Tem origem na tradição dos homens (Colossenses 2:8).

2. As igrejas que utilizam vestes sagradas não utilizam as mesmas vestes sagradas. Católicos romanos não utilizam os mesmos tipos de vestes sagradas que católicos ortodoxos gregos. Dentro do próprio catolicismo romano, as vestes foram mudando ao longo dos séculos. Isso prova que essas vestes não procedem de uma tradição genuinamente apostólica, mas são invenções humanas. Se fossem vestes apostólicas, seriam sempre iguais desde o primeiro século. As vestes dos sacerdotes levitas eram sempre iguais desde o tempo de Moisés. A verdadeira tradição apostólica, então, é não utilizar vestes sagradas, mas somente vestes comuns que refletem uma postura de ordem e decência (1 Coríntios 14:40).

OS REFORMADORES UTILIZAVAM VESTES LITÚRGICAS?

Os Reformadores da tradição Reformada (herdeiros da Reforma suíça) do século 16, como Heinrich Bullinger, Martin Bucer, Pietro Martire Vermigli e João Calvino, não defendiam o uso de vestes litúrgicas. João Calvino escreveu:

“Quanto às invenções humanas, justificadas pela autoridade da Igreja, digo que estas não podem ser desculpadas da acusação de crueldade, e por isso mesmo não podem ser imputadas à Igreja. Eis por que combatemos corajosamente a tirania das tradições humanas que nos são apresentadas sob a autoridade da Igreja (…) Quanto à origem apostólica dessas tradições, isso é puro engano, visto que todo ensinamento dos Apóstolos jamais pretendeu oprimir as consciências com novas observâncias, mas evitar toda contaminação do culto divino por novas invenções. Além disso, se resta alguma credibilidade às histórias e documentos antigos, os Apóstolos não somente desconheceram, mas nem mesmo ouviram falar das coisas que lhes atribuem (…) Para não nos estendermos muito nessa exposição, contentemo-nos com um só exemplo. No tempo dos Apóstolos, havia grande simplicidade na administração da Ceia do Senhor (…) Mas logo apareceram falsificadores que, unindo peças de procedências diversas, inventaram as vestes sacerdotais, os ornamentos do altar, e todas essas inutilidades teatrais que hoje vemos na missa.” (Institutas da Religião Cristã, 4:10:18-19)

Outrora, incenso, luminárias, vestes sacerdotais, altares e cerimônias desse gênero agradavam a Deus e a razão consistia em que nada é mais precioso ou aceitável a Deus do que a obediência. Agora, desde a vinda de Cristo, tais questões mudaram inteiramente. Devemos, pois, considerar o que nos impõe sob o evangelho, para que não sigamos à risca o que os patriarcas observaram sob a lei, pois o que naquele tempo era uma observação santa do culto divino agora seria um chocante sacrilégio.” (Comentário de João 4:20)

Visto que Cristo é o sacerdote eterno, ele deve ser distinto de Arão pela forma de sua instituição. E assim o foi em razão de não ser Moisés, um mortal que o sagrara, e sim o Espírito Santo; e não foi com óleo, nem com sangue de bodes, nem com vestimentas exteriores, mas com o poder celestial, o qual o apóstolo contrasta com os elementos frágeis. Vemos, pois, como se exibe em Cristo a eternidade do sacerdócio.” (Comentário de Hebreus 7:16)

Alguns pensam que João Calvino e outros Reformadores usavam vestes litúrgicas porque eles costumavam usar uma toga. Contudo, a toga não era usada como uma veste sagrada. Era exatamente o contrário. Eles deixaram de usar as vestes litúrgicas do catolicismo romano e passaram a usar vestes comuns. Naquele tempo, a toga era usada como uma veste comum, como uma alternativa para as vestes sagradas utilizadas no catolicismo romano. A toga daquela época seria equivalente ao pastor que hoje que se veste com roupa social. Era uma roupa comum que reflete uma postura de ordem e decência (1 Coríntios 14:40). Isso significa que quando a toga é utilizada como uma veste sagrada, quando um simbolismo espiritual especial é atribuída a ela, como às vezes acontece nos dias de hoje, ela deixa de ser uma opção legítima.

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