O Que Cristo e os Apóstolos Ensinaram Sobre o Dom de Línguas?

Como já explicamos em outro artigo, todos os atos de culto a Deus dependem das operações do Espírito Santo para acontecer. Sem a obra do Espírito Santo não haveria Bíblia (1 Pedro 1:19-21; cf. Marcos 12:36; Atos 1:16, 3:18, 28:25; Hebreus 3:7, 9:8, 10:15), não haveria oração (Romanos 8:26), não haveria cântico (Efésios 5:18-19) e não haveria pregação (1 Coríntios 12:28; Romanos 12:7). O fundamento do culto apostólico e reformado é a pessoa e a obra do Espírito Santo.

O QUE É O DOM DE LÍNGUAS?

Antes de subir ao Céu, o Senhor Jesus falou sobre um dom que a Igreja receberia depois da sua partida – o dom de línguas: “E estes sinais seguirão aos que crerem: em meu nome expulsarão os demônios; falarão novas línguas” (Marcos 16:17). O que seriam essas “línguas“? Na epístola aos Coríntios, o apóstolo Paulo explicou que eram os diferentes idiomas dos povos que existem na terra (1 Coríntios 14:21). O evangelista Lucas disse o mesmo (Atos 2:7-11). Ou seja, o dom de línguas era a capacidade de milagrosamente falar em novos idiomas sem nunca ter estudado antes.  No Brasil, se alguém quiser falar em inglês fluentemente, normalmente precisa fazer um curso de pelo menos 4 anos. Quando os doze apóstolos receberam o dom de línguas, eles imediatamente começaram a falar em novas línguas sem nem precisar estudar (Atos 2:7-11).

O livro de Atos parece indicar que eles não falavam nessas novas línguas primariamente para conseguir se comunicar com as pessoas. Parece-me que o uso primário dessas novas línguas era na oração a Deus:

“E, cumprindo-se o dia de Pentecostes, estavam todos concordemente no mesmo lugar; e de repente veio do céu um som, como de um vento veemente e impetuoso, e encheu toda a casa em que estavam assentados. E foram vistas por eles línguas repartidas, como que de fogo, as quais pousaram sobre cada um deles. E todos foram cheios do Espírito Santo, e começaram a falar noutras línguas, conforme o Espírito Santo lhes concedia que falassem. E em Jerusalém estavam habitando judeus, homens religiosos, de todas as nações que estão debaixo do céu. E, quando aquele som ocorreu, ajuntou-se uma multidão, e estava confusa, porque cada um os ouvia falar na sua própria língua. E todos pasmavam e se maravilhavam, dizendo uns aos outros: Pois quê! não são galileus todos esses homens que estão falando? Como, pois, os ouvimos, cada um, na nossa própria língua em que somos nascidos? Partos e medos, elamitas e os que habitam na Mesopotâmia, Judeia, Capadócia, Ponto e Ásia, E Frígia e Panfília, Egito e partes da Líbia, junto a Cirene, e forasteiros romanos, tanto judeus como prosélitos, Cretenses e árabes, todos nós temos ouvido em nossas próprias línguas falar das grandezas de Deus. E todos se maravilhavam e estavam suspensos, dizendo uns para os outros: Que quer isto dizer? E outros, zombando, diziam: Estão cheios de mosto. Pedro, porém, pondo-se em pé com os onze, levantou a sua voz, e disse-lhes: Homens judeus, e todos os que habitais em Jerusalém, seja-vos isto notório, e escutai as minhas palavras.” (Atos 2:1-14)

“E, dizendo Pedro ainda estas palavras, caiu o Espírito Santo sobre todos os que ouviam a palavra. E os fiéis que eram da circuncisão, todos quantos tinham vindo com Pedro, maravilharam-se de que o dom do Espírito Santo se derramasse também sobre os gentios. Porque os ouviam falar línguas, e magnificar a Deus.” (Atos 10:44-46)

Em Atos 2, quando os doze apóstolos “começaram a falar noutras línguas(v. 4), não me parece que suas palavras eram dirigidas ao próprio povo. O povo ouvia os apóstolos falar, mas parece-me que eles estavam falando com Deus, louvando a Deus: “todos nós temos ouvido em nossas próprias línguas falar das grandezas de Deus(v. 11). Como lemos também em Atos 10: “Porque os ouviam falar línguas, e magnificar a Deus(v. 46). Isso condiz o que também lemos em 1 Coríntios 14: “O que fala em língua desconhecida não fala aos homens, senão a Deus (v. 2). “Porque, se eu orar em língua desconhecida…” (1 Coríntios 14:13-14).

Quando nós estudamos para aprender um novo idioma, nosso objetivo é se comunicar com pessoas humanas que falam naquele idioma. Mas se o dom de línguas era utilizado na oração, qual seria o objetivo de orar a Deus em um idioma de outro povo e não na língua materna? Segundo o apóstolo Paulo, o objetivo era servir de sinal visível e extraordinário para os judeus incrédulos de que Deus estava verdadeiramente salvando os gentios: “De sorte que as línguas são um sinal, não para os fiéis, mas para os infiéis” (1 Coríntios 14:22). Se olharmos para o verso anterior, veremos que esses infiéis eram os judeus infiéis: “Está escrito na lei: Por gente de outras línguas, e por outros lábios, falarei a este povo; e ainda assim me não ouvirão, diz o Senhor” (1 Coríntios 14:21).  Paulo está citando o profeta Isaías: “Assim por lábios gaguejantes, e por outra língua, falará a este povo” (Isaías 28:11). “Este povo” (1 Coríntios 14:21; Isaías 28:11) eram os judeus “infiéis” (1 Coríntios 14:22). No tempo do Novo Testamento, os judeus tinham dificuldades para entender e aceitar que outros povos – chamados de gentios – poderiam ser introduzidos na Igreja em pé de igualdade com eles. Por exemplo, quando Pedro pregou aos gentios na casa do centurião Cornélio, ele foi questionado e teve que se explicar:

“E ouviram os apóstolos, e os irmãos que estavam na Judeia, que também os gentios tinham recebido a palavra de Deus. E, subindo Pedro a Jerusalém, disputavam com ele os que eram da circuncisão, dizendo: Entraste em casa de homens incircuncisos, e comeste com eles.” (Atos 11:1-3)

Quando os gentios se converteram na casa de Cornélio, eles imediatamente receberam o dom de línguas:

“E, dizendo Pedro ainda estas palavras, caiu o Espírito Santo sobre todos os que ouviam a palavra. E os fiéis que eram da circuncisão, todos quantos tinham vindo com Pedro, maravilharam-se de que o dom do Espírito Santo se derramasse também sobre os gentios. Porque os ouviam falar línguas, e magnificar a Deus.” (Atos 10:44-46)

Aqui os judeus ficaram maravilhados por ver que os gentios também recebiam o Espírito Santo. Isso indica que eles tinham algum preconceito contra os gentios. Mas de que maneira isso servia de sinal especificamente para os judeus infiéis (1 Coríntios 14:21-22; Isaías 28:11)? Da seguinte maneira: como o dom de línguas era a capacidade milagrosa de falar nos idiomas dos gentios, ele milagrosamente indicava que Deus estava aceitando esses povos como parte de seu povo. Em outras palavras, se o Espírito Santo estava milagrosamente levando pessoas a orar nos idiomas desses povos, isso era um poderoso sinal de que Deus queria ser adorado pelas pessoas desses povos, era um poderoso sinal de que o Cordeiro foi morto para salvar pessoas de “todas as nações, e tribos, e povos, e línguas” (Apocalipse 7:9). E mais: se Deus estava incluindo os gentios na Igreja, isso sinalizava que Deus estaria julgando os judeus infiéis:

“Pois quê? O que Israel buscava não o alcançou; mas os eleitos o alcançaram, e os outros foram endurecidos. Como está escrito: Deus lhes deu espírito de profundo sono, olhos para não verem, e ouvidos para não ouvirem, até ao dia de hoje. E Davi diz: Torne-se-lhes a sua mesa em laço, e em armadilha, E em tropeço, por sua retribuição; Escureçam-se-lhes os olhos para não verem, E encurvem-se-lhes continuamente as costas. Digo, pois: Porventura tropeçaram, para que caíssem? De modo nenhum, mas pela sua queda veio a salvação aos gentios, para os incitar à emulação.” (Romanos 11:7-11)

É por isso que o dom de línguas não pode ser a capacidade de falar em um idioma celestial, como ensina o movimento pentecostal. Se o dom de línguas fosse a capacidade de falar em um idioma celestial, de que maneira o dom de línguas poderia ser um sinal para os judeus infiéis (1 Coríntios 14:21-22; Isaías 28:11)? O dom de línguas era um sinal para os judeus infiéis porque eram os idiomas de outros povos ( 1 Coríntios 14:21) – os gentios que estavam sendo colocados na Igreja no lugar dos judeus incrédulos (Romanos 11:11). Ou seja, quando um judeu incrédulo ouvia um cristão orar em uma língua dos gentios, isso era um sinal milagroso de que Deus preferia receber a adoração de gentios crentes do que de judeus incrédulos e, por isso, o judeu incrédulo seria julgado e substituído pelo gentio. Como está escrito: “Alguns dos ramos [judeus] foram quebrados, e tu, sendo zambujeiro [gentio], foste enxertado em lugar deles” (Romanos 11:17). Era importante que a língua fosse falada por um milagre, sem ter estudado o idioma, para que fosse claramente vista como um sinal de Deus. 

COMO OS APÓSTOLOS ENSINAVAM QUE O DOM DE LÍNGUAS DEVERIA SER EXERCIDO NA IGREJA?

Como é o caso de todos os atos de culto a Deus, o dom de línguas só poderia ser exercido no culto público se fosse exercido segundo as prescrições dos apóstolos. Encontramos as prescrições dos doze apóstolos e de Paulo sobre isso em 1 Coríntios 14:

1 – Não poderia haver mais de três pessoas falando em línguas desconhecidas no mesmo culto. Três pessoas falando em línguas desconhecidas no mesmo culto já era considerado por Paulo como “muito”.

“No caso de alguém falar em outra língua, que não sejam mais do que dois ou quando muito três…” (1 Coríntios 14:27)

2 – Essas duas, no máximo três pessoas, não poderiam falar ao mesmo tempo. Tinham que falar uma de cada vez. Se João falasse em línguas desconhecidas, todos que estivessem presentes no culto tinham que se calar, ouvir João falar e somente depois que João terminasse de falar é que uma segunda pessoa (quando muito, uma terceira) teria autorização para falar:

“No caso de alguém falar em outra língua, que não sejam mais do que dois ou quando muito três, e isto sucessivamente…”(1 Coríntios 14:27)

3 – Quando chegasse a vez de alguém falar em uma língua desconhecida, ele não poderia falar e deixar a igreja sem entender. Ao falar, era obrigatório que alguém traduzisse o que estava sendo dito:

“No caso de alguém falar em outra língua, que não sejam mais do que dois ou quando muito três, e isto sucessivamente, e haja quem interprete“. (1 Coríntios 14:27)

E se não houvesse um tradutor para traduzir para a igreja o que estava sendo dito? Neste caso, se não houvesse um tradutor, Paulo diz que deveriam ficar calados. Ou seja, estavam proibidos de falar para a igreja e poderiam, no máximo, falar bem silenciosamente, de forma que ninguém na igreja pudesse ouvi-los falando:

“Mas, não havendo intérprete, fique calado na igreja, falando consigo mesmo e com Deus”. (1 Coríntios 14:28)

Então, para resumir:

Em um culto, não poderia haver mais de três pessoas falando em línguas desconhecidas, tinha que ser um falando de cada vez, não poderia ser mais de um falando ao mesmo tempo, era necessário haver um tradutor para traduzir o que estava sendo dito e, não havendo um tradutor, o adorador era proibido de falar em voz alta.

Depois de explicar tudo isso, Paulo explica que muitos cristãos não iriam aceitar o que ele tinha acabado de explicar – não iriam aceitar o que Paulo ensinava sobre a maneira correta de exercer o dom de línguas na igreja. Sabendo disso, Paulo advertiu que quem negasse o que estava ensinando, estaria negando mandamentos do próprio Jesus:

“Se alguém se considera profeta ou espiritual, reconheça ser mandamento do Senhor o que vos escrevo. E, se alguém o ignorar, será ignorado”. (1 Coríntios 14:37, 38)

NÃO ACEITE O EXERCÍCIO DE DONS ESPIRITUAIS DE UMA MANEIRA DIFERENTE DO QUE OS APÓSTOLOS NOS ENSINARAM

Cristo enviou os apóstolos para que eles nos ensinassem de que maneira convém servir a Deus: “Finalmente, irmãos, vos rogamos e exortamos no Senhor Jesus, que assim como recebestes de nós, de que maneira convém andar e agradar a Deus, assim andai, para que possais progredir cada vez mais. Porque vós bem sabeis que mandamentos vos temos dado pelo Senhor Jesus” (1 Tessalonicenses 4:1-2). Sendo assim, se uma igreja promove o exercício de dons espirituais de uma maneira diferente do que foi ensinado pelos doze apóstolos e por Paulo, nenhum cristão tem a obrigação de aceitar que são legítimas manifestações dos dons do Espírito Santo.

Muitos se perguntam se o dom de línguas continua a vigorar em nossos dias. Mas há outra questão que é logicamente anterior a essa. Antes de saber se o dom de línguas continua a vigorar ou não, precisamos saber exatamente o que é o dom do Espírito na Bíblia. Não faz sentido discutir se uma coisa continua a vigorar ou não sem primeiro definir o que é. Se o dom de línguas continua a vigorar em nossos dias, se o dom de línguas continua a vigorar no século 21, então ele precisa vigorar da maneira que a Bíblia descreve. Com base em 1 Coríntios 14, eu listei aqui três características principais do que os apóstolos ensinavam ser a genuína manifestação do dom de línguas em um culto público. Nenhuma igreja tem o direito de dizer que o dom de línguas se manifesta em seus cultos se o que ocorre não está em conformidade com a prescrição de Paulo em 1 Coríntios 14. Nenhuma igreja tem o direito de ordenar que seus membros creiam ou participem de manifestações espirituais que são diferente do que ordenaram os apóstolos.

“Então, irmãos, estai firmes e retende as tradições que vos foram ensinadas, seja por palavra, seja por epístola nossa.” (2 Tessalonicenses 2:15)

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