“Quando, pois, virdes que a abominação da desolação, de que falou o profeta Daniel, está no lugar santo; quem lê, atenda; então, os que estiverem na Judeia, fujam para os montes.” (Mateus 24:15-16)
Em uma postagem anterior, já demonstramos que, no sermão profético, quando Jesus falou sobre os falsos messias (Mateus 24:4-5; Marcos 13:5-6; Lucas 21:8), sobre as guerras e rumores de guerra (Mateus 24:6-7; Marcos 13:7-8; Lucas 21:9-10), sobre as fomes (Mateus 24:7; Marcos 13:8; Lucas 21:11), sobre as perseguições (Mateus 24:9; Marcos 13:9, 11-13; Lucas 21:12-19) e sobre a pregação do evangelho entre as nações (Mateus 24:14; Marcos 13:10; Lucas 21:13), ele está falando sobre a ocorrência dessas coisas no contexto do primeiro século, antes da guerra judaico-romana, como coisas que aconteceriam antes daquela guerra, que durou sete anos (66 – 73 AD). Nesta postagem, falaremos sobre o último sinal da destruição do templo mencionado por Cristo – o sinal da abominação da desolação.
Segundo Cristo, quando os cristãos vissem esse sinal – a abominação da desolação – eles deveriam fugir da Judeia imediatamente:
MATEUS 24
(15) Quando, pois, virdes que a abominação da desolação, de que falou o profeta Daniel, está no lugar santo; quem lê, atenda;
(16) Então, os que estiverem na Judeia, fujam para os montes;
(17) E quem estiver sobre o telhado não desça a tirar alguma coisa de sua casa;
(18) E quem estiver no campo não volte atrás a buscar as suas vestes.
(19) Mas ai das grávidas e das que amamentarem naqueles dias!
(20) E orai para que a vossa fuga não aconteça no inverno nem no sábado.
A necessidade de fugir especificamente da Judeia confirma que Jesus estava falando sobre a guerra judaico-romana de 66-73 AD, que foi quando o templo de Deus em Jerusalém foi destruído pelos romanos (Mateus 24:1-3). E a necessidade de fugir da Judeia imediatamente é muito enfatizada nos versos 17-20. Os cristãos não deveriam voltar para buscar nada em casa (v. 17), não poderiam voltar nem para buscar roupa (v. 19). E o que é dito nos versos 19-20 sobre as grávidas, sobre as que amamentam, sobre o inverno e sobre o sábado são uma referência aos fatores que tornariam a fuga mais difícil. A fuga seria muito mais difícil para as grávidas e para quem tivesse um filho pequeno. Semelhantemente, por causa do frio, a fuga seria muito mais difícil no inverno.
Se diante daquele sinal específico – o sinal da abominação da desolação – os cristãos deveriam fugir imediatamente, era muito importante que aquela geração de cristãos fossem capazes de identificar o sinal dado por Jesus. Sobre isso, Lucas é mais explícito do que Mateus e Marcos:
LUCAS 21
(20) Mas, quando virdes Jerusalém cercada de exércitos, sabei então que é chegada a sua desolação.
(21) Então, os que estiverem na Judeia, fujam para os montes; os que estiverem no meio da cidade, saiam; e os que nos campos não entrem nela.
(22) Porque dias de vingança são estes, para que se cumpram todas as coisas que estão escritas.
Quando comparamos Mateus e Marcos com Lucas, fica muito claro que a “abominação da desolação, de que falou o profeta Daniel… no lugar santo” (Mateus 24:15; Marcos 13:14) é o mesmo que “Jerusalém cercada de exércitos” (Lucas 21:20). O “lugar santo” é a cidade de Jerusalém (cf. Isaías 52:1; Mateus 4:5; 27:53) e a “abominação da desolação” são os exércitos romanos. Mas por que os exércitos romanos são chamados de “abominação“? Creio que é porque os exércitos romanos marchavam com ídolos durante a guerra. Flávio Josefo, o importante historiador do primeiro século, falou sobre isso em sua obra sobre a história da guerra judaico-romana:
“Vespasiano resolveu atacar em pessoa a Galileia e partiu de Ptolemaida, depois de ter organizado a marcha, segundo o costume dos romanos. As tropas auxiliares, mais levemente armadas, marchavam na frente, para repelir as escaramuças dos inimigos e fazerem explorações e batidas nos bosques e em outros lugares, onde poderiam haver emboscadas. Uma parte da infantaria e da cavalaria romana seguia, e dez soldados de cada companhia, com suas armas e as coisas necessárias para fazer o acampamento. Os exploradores acompanhavam-nos para aplanar os caminhos, cortar as árvores que lhes poderiam impedir a passagem e retardar-lhes a marcha. A bagagem dos oficiais ia depois, com a cavalaria, escoltando-a. Vespasiano marchava com tropas escolhidas e alguns lanceiros; tirava, para esse fim, cento e vinte mestres de cada um dos corpos de cavalaria. As máquinas, para a tomada das praças, vinham em seguida, e depois, os tribunos e os oficiais, acompanhados por soldados escolhidos. Vinha depois a águia imperial, ilustre insígnia dos romanos, que eles julgavam dever colocar à frente de seus exércitos, para mostrar que assim como a águia reina no ar sobre todas as aves, eles reinam na terra sobre todos os homens e que em qualquer lugar ao qual levarem a guerra, ela lhes serve de presságio de que serão sempre vencedores. As outras insígnias, nas quais havia imagens, que eles diziam sagradas, estavam em redor da águia. As trombetas e os clarins vinham depois; marchavam seis a seis, de frente, com oficiais encarregados de conservar a ordem e manter a disciplina. Os servos de cada legião acompanhavam os soldados e levavam suas bagagens sobre mulas e cavalos. Por último vinham os que traziam os víveres, os operários e outros mercenários escoltados ainda por um bom número de cavaleiros e de soldados de infantaria.” (Flávio Josefo, História dos Hebreus, Rio de Janeiro: CPAD, 2017, p. 1177-1178)
Esses ídolos, tanto a águia imperial quanto as outras imagens que eles carregavam, eram violações do segundo mandamento da lei de Deus (Êxodo 20:4; Deuteronômio 5:8). Diversas passagens do Velho Testamento chamam esse tipo de imagem de “abominação” (Êxodo 8:26; Deuteronômio 7:25-26; 27:15; 1 Reis 11:5-7; 2 Reis 23:13). Moisés enfatizou que, como Israel era o povo de Deus, não deveria existir nenhum ídolo em toda a terra de Israel:
LEVÍTICO 26
(1) Não fareis para vós ídolos, nem vos levantareis imagem de escultura, nem estátua, nem poreis pedra figurada na vossa terra, para inclinar-vos a ela; porque eu sou o SENHOR vosso Deus.
(2) Guardareis os meus sábados, e reverenciareis o meu santuário. Eu sou o SENHOR.
Como está escrito também:
DEUTERONÔMIO 7
(1) Quando o SENHOR teu Deus te houver introduzido na terra, à qual vais para a possuir, e tiver lançado fora muitas nações de diante de ti, os heteus, e os girgaseus, e os amorreus, e os cananeus, e os perizeus, e os heveus, e os jebuseus, sete nações mais numerosas e mais poderosas do que tu;
(25) As imagens de escultura de seus deuses queimarás a fogo; a prata e o ouro que estão sobre elas não cobiçarás, nem os tomarás para ti, para que não te enlaces neles; pois abominação é ao SENHOR teu Deus.
(26) Não porás, pois, abominação em tua casa, para que não sejas anátema, assim como ela; de todo a detestarás, e de todo a abominarás, porque anátema é.
Segundo o historiador Flávio Josefo, o rei Herodes I, que perseguiu Jesus quando ele era um bebê e morreu quando ele ainda era uma criança (Mateus 2), chegou a violar Levítico 26:1-2 diretamente através da águia imperial:
“Entre essas obras profanas de Herodes ele tinha feito colocar e consagrar sobre o portal do Templo, uma águia de ouro, de tamanho extraordinário e de muito valor, embora as nossas leis proíbam expressamente fazer figuras de animais.” (Flávio Josefo, História dos Hebreus, Rio de Janeiro: CPAD, 2017, p. 799)
Então, cerca de trinta anos depois da morte de Herodes I, quando Jesus falou sobre a “abominação da desolação, de que falou o profeta Daniel… no lugar santo” (Mateus 24:15; Marcos 13:14), ele estava falando sobre “Jerusalém cercada de exércitos” (Lucas 21:20). Sendo assim, quando os cristãos vissem os exércitos do Império Romano com todos os seus ídolos cercarem Jerusalém, eles teriam a obrigação de fugir da região da Judeia (Mateus 24:16-20; Marcos 13:14-18; Lucas 21:21-23).
Quando isso aconteceu? Aconteceu no ano de 66 AD, ano em que a guerra começou. Em 66 AD, os romanos cercaram e invadiram Jerusalém. Vamos ler o que Flávio Josefo escreveu sobre isso:
“No décimo segundo ano do reinado de Nero, começou a guerra; o que se deu sob Céstio, que comandava as tropas romanas.” (Flávio Josefo, História dos Hebreus, Rio de Janeiro: CPAD, 2017, p. 986)
“Céstio, querendo aproveitar a confusão, marchou contra os revoltosos, pô-los em fuga e os perseguiu até Jerusalém. Acampou a sete estádios da cidade, em um lugar chamado Escopo; lá ficou três dias sem atacar, na esperança de que, durante esse tempo, eles voltassem ao dever e contentou-se em mandar seus soldados buscar trigo nas aldeias vizinhas. No quarto dia, que era o dia treze de outubro, marchou, em boa ordem, contra a cidade com todo seu exército, e os judeus ficaram tão surpreendidos e atônitos com a disciplina dos romanos, que abandonaram a cidade e se retiraram ao Templo. Céstio, depois de ter atravessado Beseta, Scenópolis e o mercado, a que chamam o mercado dos materiais, e tê-lo incendiado, aquartelou na cidade alta, perto do palácio real; se tivesse então dado assalto, ter-se-ia apoderado de Jerusalém e teria posto fim à guerra. Mas Tirano e Prisco, marechais de campo e vários oficiais de cavalaria, dissuadiram-no desse intento e foram causa de que, pela longa duração que depois teve essa guerra, de que os judeus sofressem males incomparavelmente maiores do que aqueles que então teriam sofrido… No sexto dia, Céstio, com um grande número de tropas escolhidas e de soldados que atiravam flechas, atacou o Templo do lado do norte; os judeus lançaram-lhes dardos do alto dos pórticos e os obrigaram diversas vezes a recuar. Mas, por fim, os da primeira linha dos romanos, cobriram-se com os escudos, apoiando-os contra os muros; os que os seguiam uniram
também os escudos a estes, e assim os outros fizeram em fila a mesma coisa e formaram aquela espécie de couraça a que dão o nome de tartaruga; pondo-se a salvo dos dardos e das flechas dos judeus, trabalharam com segurança para derribar o muro e incendiar as portas do Templo. Os sediciosos ficaram tão assustados que, se julgando perdidos, vários fugiram para fora da cidade… Se esse general tivesse continuado o cerco, teria logo se apoderado da cidade; mas Deus, irritado contra aqueles malvados, não permitiu que a guerra acabasse logo. Céstio foi tão mal informado do desespero dos revoltosos e do afeto do povo por ele, que levantou o cerco, quando mais tinha motivo de esperar ser bem-sucedido em seu empreendimento. Os sitiados, considerando uma retirada tão improvisada, como uma fuga, retomaram ânimo, atacaram-lhes a retaguarda e mataram alguns cavaleiros e soldados de infantaria. Céstio alojou-se naquele mesmo dia no acampamento que havia fortificado perto de Scopur e continuou a marcha no dia seguinte. Essa precipitação aumentou ainda mais a coragem dos judeus. Continuaram a atacar as suas últimas tropas, mataram ainda outros, porque o caminho, por onde os romanos marchavam, era fechado por estacas e eles lançavam-lhes dardos e os feriam por trás, sem que estes lhes voltassem o rosto, porque imaginavam-se perseguidos por uma multidão infinita de homens, além de que, estando armados pesadamente, não ousavam romper as fileiras, tendo que enfrentar inimigos tão dispostos e tão ágeis, que se viam por todos os lados quase ao mesmo tempo. Assim sofriam muito do ataque dos judeus e não lhes podiam causar mal algum. Aquela retirada continuou dessa maneira até que os romanos, depois de ter perdido, além de vários soldados, Prisco, que comandava a sexta legião, Longino, Tribuno, Emílio Jucundo, mestre de campo de um regimento de cavalaria e de terem sido obrigados a abandonar muitas bagagens, chegaram a Gabaom, onde tinham acampado antes. Céstio aí passou dois dias, sem saber a que se resolvem-mas, vendo, no terceiro dia, que o número dos inimigos crescia sempre mais e que eles tomavam todos os lugares vizinhos, julgou que a demora ser-lhe-ia prejudicial e, se ele retardasse mais a sua partida, teria mais inimigos ainda para enfrentar. Assim, para facilitar a fuga, ordenou que se abandonasse toda a bagagem, que matassem os burros, as mulas e os outros animais de carga, com exceção dos que lhes eram necessários para levar os dardos e as máquinas; mas, temiam que estes mesmos caíssem nas mãos dos inimigos. Suas tropas marcharam então para Betorom, sem que os judeus os atacassem, enquanto estavam em lugares espaçosos e descobertos, mas quando os viam em passagens estreitas e nas descidas, atacavam-nos pela frente, para impedir que avançassem, e pela retaguarda, para impeli-los ainda mais para os vales; onde, como eles ocupavam as elevações e eram em grande número, dizimavam-nos a golpes de flechas. A infantaria romana encontrava-se nessa situação, mas a cavalaria ainda estava em muito maior perigo, porque aquela grande quantidade de flechas impedia-lhe conservar as colunas na marcha, e aqueles lugares difíceis e escarpados não lhes permitiam enfrentar os inimigos. Por outro lado, como os judeus ocupavam todos os rochedos e todos os vales, os que pensavam ali se refugiar, eram logo mortos. Os romanos, vendo-se obrigados a não poder combater, nem fugir, ficaram tão desesperados, que soltavam imprecações e uivos de raiva, bem como derramavam lágrimas de aflição. Os judeus, ao contrário, soltavam gritos de alegria, continuando sempre a atacá-los e a matá-los; todo o ar ressoava com esses clamores de alegria e de dor. Se a noite, que deu aos romanos ocasião de se salvar em Beterom, não tivesse sobrevindo, o exército de Céstio teria sido totalmente destruído. Os judeus rodearam-nos em seguida de todos os lados e vigiavam todas as passagens para impedir que eles saíssem; assim Céstio, vendo que não podia enfrentá-los abertamente, pensou em organizar a retirada. Escolheu entre seus soldados os mais valentes, que ele mandou subir ao teto das casas, com ordem de gritar bem alto: Quem vem lá? Como fazem as sentinelas, a fim de fazer os inimigos pensarem que o exército não havia deixado o acampamento. Partiu depois com todo o restante e o fez sem rumor, trinta estádios de caminho. Quando os judeus viram pela manhã que os romanos se tinham retirado, lançaram-se sobre os quatrocentos homens, mataram-nos a flechadas e puseram-se em perseguição a Céstio. Mas se ele caminhara com tanta rapidez durante a noite, com muito mais pressa ainda marchou durante o dia, e o espanto de seus soldados foi tão grande, que eles abandonaram todas as máquinas para os assaltos. Os judeus, delas mesmas se serviram utilmente contra eles e depois de os ter perseguido até Antipátrida, vendo que não podiam alcançá-los, retiraram-se com as máquinas, despojaram aos mortos, reuniram todos os despojos e voltaram a Jerusalém com clamores de vitória, tendo perdido poucos homens apenas, ao passo que do lado dos romanos o número de mortos tanto de suas próprias tropas, como das auxiliares, foi de quatro mil soldados de infantaria e trezentos e oitenta de cavalaria. Isso aconteceu no oitavo dia de novembro do décimo segundo ano do reinado de Nero. Depois de tão infeliz retirada de Céstio, vários dos principais dos judeus saíram de Jerusalém, como quem sai de um navio prestes a naufragar.” (Flávio Josefo, História dos Hebreus, Rio de Janeiro: CPAD, 2017, p. 1152-1155)
Segundo Josefo, depois de invadir Jerusalém e aterrorizar a cidade, chegando a incendiar as portas do templo de Jerusalém, Céstio, que poderia facilmente conquistar a cidade e acabar logo com a guerra, inexplicavelmente desistiu de lutar e foi embora com todo o seu exército. Tendo desistido, o exército dos judeus entendeu que ele tinha recuado por medo e, por isso, eles decidiram perseguir o exército romano. Ao perseguir o exército romano, eles foram muito bem sucedidos e isso fez crescer a certeza de que eles poderiam vencer a guerra. Essa retirada inesperada de Céstio, que fez a coragem dos judeus crescer, foi o cumprimento da profecia de Jesus sobre os dias que seriam abreviados:
MATEUS 24
(15) Quando, pois, virdes que a abominação da desolação [Céstio e o exército romano com todos os seus ídolos], de que falou o profeta Daniel, está no lugar santo [em Jerusalém]; quem lê, atenda;
(16) Então, os que estiverem na Judéia, fujam para os montes;
(17) E quem estiver sobre o telhado não desça a tirar alguma coisa de sua casa;
(18) E quem estiver no campo não volte atrás a buscar as suas vestes.
(19) Mas ai das grávidas e das que amamentarem naqueles dias!
(20) E orai para que a vossa fuga não aconteça no inverno nem no sábado;
(21) Porque haverá então grande tribulação, como nunca houve desde o princípio do mundo até agora, nem tampouco há de haver.
(22) E, se aqueles dias não fossem abreviados, nenhuma carne se salvaria; mas por causa dos escolhidos serão abreviados aqueles dias.
Os dias abreviados do verso 22 não são os dias da grande tribulação do verso 21, mas são os dias da abominação da desolação do verso 15. Quando os cristãos vissem a abominação da desolação, que foi Céstio e o exército romano no ano de 66 AD, eles deveriam fugir, como os versos 16-20 mandam fazer. Então, o que o verso 22 está dizendo é que, para possibilitar a fuga dos cristãos, para que os eleitos conseguissem fugir, aqueles dias – os dias do cerco dos romanos – seriam abreviados. Foi exatamente o que aconteceu em 66 AD. Os dias foram abreviados quando Céstio e seu exército inexplicavelmente decidiram ir embora. Ou seja, a decisão aparentemente inexplicável de Céstio, que tinha plenas condições de vencer a guerra, mas acabou sofrendo uma humilhante derrota, pode ser compreendida à luz da providência secreta de Deus. “Como ribeiros de águas assim é o coração do rei na mão do SENHOR, que o inclina a todo o seu querer” (Provérbios 21:1). O coração de Céstio foi inclinado pelo Senhor a tomar a decisão de ir embora porque “se aqueles dias não fossem abreviados, nenhuma carne se salvaria; mas por causa dos escolhidos serão abreviados aqueles dias” (Mateus 24:22). Como aqueles dias foram abreviados, os cristãos puderam cumprir a ordem dos versos 16-20 e fugir.
Quando entendemos tudo isso, podemos entender melhor a importância da ordem de Jesus para fugir. Como Josefo explica, depois da inesperada retirada de Céstio, os judeus, “considerando uma retirada tão improvisada, como uma fuga, retomaram ânimo,” e “atacaram-lhes“. E depois dessa humilhante derrota que os romanos sofreram, o exército dos judeus “voltaram a Jerusalém com clamores de vitória“. Ou seja, depois desse cerco de 66 AD, que foi o cumprimento da profecia da abominação da desolação (Mateus 24:15; Marcos 13:14), as forças judaicas passaram a ter motivos aparentemente muito fortes para crer que eles realmente poderiam vencer a guerra contra Roma. Em outras palavras, os judeus passaram a ter fortes motivos para crer que eles deveriam permanecer em Jerusalém e na Judeia para lutar contra Roma em defesa de Israel e do templo de Deus em Jerusalém. Mais do que isso, diante de tamanha vitória sobre o exército romano, eles passariam a ter motivos aparentemente plausíveis para chamar os desertores de covardes sem honra. Por isso, a ordem de Jesus foi tão importante para aqueles primeiros cristãos da Judeia: “Quando, pois, virdes que a abominação da desolação [Céstio e o exército romano com todos os seus ídolos], de que falou o profeta Daniel, está no lugar santo [em Jerusalém]… fujam…” (Mateus 24:15-16) Eles não deveriam crer que a impressionante vitória sobre Céstio era um sinal de que Israel tinha chances de vencer. Eles deveriam fugir da Judeia por entender que a derrota de Israel na guerra havia sido preordenada por Deus. A esperança de vencer a guerra era uma falsa esperança. O recuo de Céstio não indicava que a vitória era possível. Indicava somente que Deus queria salvar os cristãos da cidade para que eles não fossem destruídos. “E, se aqueles dias não fossem abreviados, nenhuma carne se salvaria; mas por causa dos escolhidos serão abreviados aqueles dias” (Mateus 24:22). Nesse contexto, podemos entender melhor o que Jesus diz em seguida sobre os falsos cristos e falsos profetas:
MATEUS 24
(23) Então, se alguém vos disser: Eis que o Cristo está aqui, ou ali, não lhe deis crédito;
(24) Porque surgirão falsos cristos e falsos profetas, e farão tão grandes sinais e prodígios que, se possível fora, enganariam até os escolhidos.
(25) Eis que eu vo-lo tenho predito.
(26) Portanto, se vos disserem: Eis que ele está no deserto, não saiais. Eis que ele está no interior da casa; não acrediteis.
(27) Porque, assim como o relâmpago sai do oriente e se mostra até ao ocidente, assim será também a vinda do Filho do homem.
(28) Pois onde estiver o cadáver, aí se ajuntarão as águias.
Depois da humilhante derrota que os romanos sofreram, o exército dos judeus “voltaram a Jerusalém com clamores de vitória” e “empregavam a força e a doçura para atrair ao seu partido os que estavam do lado dos romano” (Flávio Josefo, História dos Hebreus, Rio de Janeiro: CPAD, 2017, p. 1156). Segundo Josefo, falsos profetas eram utilizados para convencer o povo de que eles seriam bem sucedidos na guerra contra os romanos:
“Os revoltosos serviam-se de [falsos profetas] para enganar o povo, a fim de conter com semelhantes promessas os que queriam fugir… Não devemos nos admirar da credulidade do povo, pois não há impressão que a esperança de se livrar de um grande mal bastante premente não seja capaz de exercer sobre o espírito dos que sofrem. Mas aquele povo infeliz é tanto mais digno de lástima, quanto prestando fé facilmente aos impostores que abusavam do nome de Deus para enganá-lo, fechava os olhos e tapava os ouvidos para não ver, nem ouvir os sinais certos e os verdadeiros avisos pelos quais Deus lhes tinha predito a própria ruína.” (Flávio Josefo, História dos Hebreus, Rio de Janeiro: CPAD, 2017, p. 1368).
A advertência de Jesus em Mateus 24:23-28 tinha como objetivo impedir que os cristãos fossem enganados por esses falsos profetas. Sendo assim, devemos entender o objetivo da ordem para fugir da Judeia (Mateus 24:16-20) não era somente impedir que eles fossem destruídos na guerra. Era também impedir que eles se envolvessem em falsas esperanças messiânicas.
Excelente texto, Frank.
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