“Então chegaram ao pé de Jesus uns escribas e fariseus de Jerusalém, dizendo: Por que transgridem os teus discípulos a tradição dos antigos? Pois não lavam as mãos quando comem pão.” (Mateus 15:1-2)
Durante todo o seu ministério terreno, Cristo sempre esteve envolvido em grandes controvérsias com os líderes religiosos de Israel. Aliás, foram eles que acabaram entregando Jesus às autoridades do Império Romano para que fosse morto (Marcos 15:1). O conflito envolvendo a tradicional cerimônia de lavagem (Mateus 15, Marcos 7), mais do que qualquer outro, mostra claramente o que é que estava no centro das controvérsias entre Cristo e os líderes religiosos de seu tempo. Os escribas e fariseus fizeram uma pergunta a Jesus sobre os discípulos dele: “Por que transgridem os teus discípulos a tradição dos antigos?” (v. 2) Que tradição era essa? O Evangelho de Marcos dá mais detalhes sobre isso:
“Porque os fariseus, e todos os judeus, conservando a tradição dos antigos, não comem sem lavar as mãos muitas vezes; e, quando voltam do mercado, se não se lavarem, não comem. E muitas outras coisas há que receberam para observar, como lavar os copos, e os jarros, e os vasos de metal e as camas.” (Marcos 7:3-4)
O objetivo dessa lavagem não era a higiene física. Era uma cerimônia religiosa com água que tinha como objetivo manter as pessoas e os objetos espiritualmente purificados. Os judeus de forma geral observavam essa cerimônia (Marcos 7:3), mas os líderes religiosos perceberam que os discípulos de Jesus não observavam. Por que não?
“Ele, porém, respondendo, disse-lhes: Por que transgredis vós, também, o mandamento de Deus pela vossa tradição? Porque Deus ordenou, dizendo: Honra a teu pai e a tua mãe; e: Quem maldisser ao pai ou à mãe, certamente morrerá. Mas vós dizeis: Qualquer que disser ao pai ou à mãe: É oferta ao Senhor o que poderias aproveitar de mim; esse não precisa honrar nem a seu pai nem a sua mãe, e assim invalidastes, pela vossa tradição, o mandamento de Deus. Hipócritas, bem profetizou Isaías a vosso respeito, dizendo: Este povo se aproxima de mim com a sua boca e me honra com os seus lábios, mas o seu coração está longe de mim. Mas, em vão me adoram, ensinando doutrinas que são preceitos dos homens.” (Mateus 15:3-9)
Aqui o Senhor Jesus explica por que ele não aceitava aquela cerimônia. Era uma prática religiosa que não era ordenada por Deus. Tinha origem nos homens: “Mas, em vão me adoram, ensinando doutrinas que são preceitos dos homens” (v. 9). O argumento de Jesus de estabelece um claro contraste entre dois tipos de crenças e práticas religiosas – as que foram ensinadas e ordenadas por Deus e as que foram inventadas pelos homens. As que não eram ordenados por Deus, Jesus ensinava que eram inválidas e que não deveriam ser cridas e observadas – até mesmo algo tão aparentemente pequeno quanto lavar um objeto. Essa era a raiz de todos os conflitos entre Jesus e os líderes religiosos de seu tempo.
Ao longo de toda a sua vida, Jesus sempre participou de todas as práticas religiosas que eram ordenadas por Deus para o povo de Israel. Quando ele nasceu, ele foi apresentado no templo de Jerusalém (Lucas 2:22) porque era o que Deus tinha ordenado (Êxodo 13:2, 12-15; Números 3:13; 8:15-17). Com oito dias de vida, ele foi circuncidado (Lucas 2:21) porque era o que Deus tinha ordenado (Gênesis 17:9-14). Todo sábado, ele frequentava o culto na sinagoga (Lucas 4:16) porque era o que Deus tinha ordenado (Levítico 23:3). Todo ano, ele viajava para Jerusalém para participar da festa da páscoa, da festa dos pães ázimos (Lucas 2:41; Mateus 26:17; Marcos 14:12; Lucas 22:8; João 2:13) e da festa dos tabernáculos (João 7:2, 10, 14) porque era o que Deus tinha ordenado (Levítico 23:4-8, 33-44). Por outro lado, em toda a Bíblia, não há absolutamente nenhum exemplo de Jesus participando de qualquer prática religiosa que não fosse ordenada por Deus. Pelo contrário, em todos os casos em que alguém tentava obrigar Jesus a aceitar uma prática religiosa que não era ordenada por Deus, ele sempre resistia (cf. Mateus 12:1-14).
Em um de seus debates contra os líderes religiosos da época, Jesus falou sobre o batismo:
“E, chegando ao templo, acercaram-se dele, estando já ensinando, os príncipes dos sacerdotes e os anciãos do povo, dizendo: Com que autoridade fazes isto? e quem te deu tal autoridade? E Jesus, respondendo, disse-lhes: Eu também vos perguntarei uma coisa; se me disserdes, também eu vos direi com que autoridade faço isto. O batismo de João, de onde era? Do céu, ou dos homens? E pensavam entre si, dizendo: Se dissermos: Do céu, ele nos dirá: Então por que não o crestes? E, se dissermos: Dos homens, tememos o povo, porque todos consideram João como profeta. E, respondendo a Jesus, disseram: Não sabemos. Ele disse-lhes: Nem eu vos digo com que autoridade faço isto.” (Mateus 21:23-27)
Jesus deixou seus oponentes sem resposta. A linha de raciocínio é que se o batismo de João fosse do céu, isto é, se fosse verdadeiramente ordenada por Deus, todos tinham a obrigação de crer: “Se dissermos: Do céu, ele nos dirá: Então por que não o crestes?” (v. 25) Por inferência, se eles negassem que era um rito ordenado por Deus, então eles não deveriam crer. Ou seja, somente as práticas religiosas que Deus ordenou devem ser cridas e recebidas como válidas. Novamente, o argumento de Jesus estabelece um claro contraste entre dois tipos de crenças e práticas religiosas – as que foram ensinadas e ordenadas por Deus (como o batismo, isto é, a lavagem de João) e as que foram inventadas pelos homens (como a cerimônia de lavagem que os escribas e fariseus defendiam).